quinta-feira, 23 de junho de 2011

O género, importância e gramática

Como já aqui referi, foi eleita Assunção Esteves para Presidente da Assembleia da República, sob aplausos gerais. Acontecimento importante em vários aspectos, e que desencadeou no facebook de amigos meus uma estranha polémica que tenho de transportar aqui para o Cerejas por não conseguir dizer tudo o que queria no espaço do FB.
Como ponto prévio gostaria de esclarecer desde já que nada do que vou dizer tem a ver com o Acordo Ortográfico, sobre o qual tenho muitas dúvidas e ainda não sei bem se estou a favor ou contra. Não, aqui trata-se, a meu ver, apenas de uma questão de gramática.
Dá-se o caso de que na troca de comentários com um grupo de amigos, falei na 'senhora presidenta'. Estava a brincar. Pensei que chamando assim dava um ar de mais popular ou infantil e o tom que eu desejava era esse.
Curiosamente outras pessoas também falaram em 'presidenta' e, quando à noite voltei a ligar ao fb já estava montada uma banca de prós e contras o uso de tal palavra. Sorri e ainda a sorrir fui confirmar ao dicionário priberan mas… afinal aceitam a palavra! A mais inteligente defensora dessa novidade ideia  [pessoa que aliás escreve primorosamente] fá-lo com o argumento de que até agora as mulheres não tinham capacidade de serem presidentes de nada, portanto com o assumir de tal competência seria justo que se 'feminilizasse' a palavra. Como uma honra.
Ideia extraordinária, porque se é certo que Presidente da República ou da Assembleia, em Portugal é novidade, já há milhares de mulheres presidentes de tudo e mais alguma coisa – de Conselhos Directivos, da Comissões de Trabalhadores, de Sindicatos, de Associações... Há imensas mulheres que chefiam. Afinal "presidente" é simplesmente alguém que preside, como residente é alguém que reside ou gerente alguém que gere.
Existem na nossa gramática dezenas de palavras que se usam para os dois géneros, sem que isso ofenda ninguém. Adjectivos «bisexuais» :) encontramos imensos – triste, alegre, doente, importante, contente, infeliz, paciente, irritante, transparente - a maioria dos terminados em e mudo, não tem feminino nem masculino. Então actividades vulgares em homens não seriam 'masculinas', reparem nas palavras terminadas em ista (com um A no fim) onde até ainda há mais homens: futebolista, camionista, maquinista e não futebolisto, ou camionisto ou maquinisto; o Alfredo Marceneiro não era um fadisto, nem Chopin um pianisto. E uma mulher que seja agente de polícia? E o meu dentista?
E também tropeçamos no contrário, palavras onde só se usa o masculino. Uma mulher que deite meias solas num sapato não se chama sapateira, teremos que dizer que trabalha em calçado, assim como a profissão de torneiro não terá feminino, porque torneira é outra coisa. Ou seja, acredito que para um estrangeiro não seja fácil aprender português.
Mas nós aprendemos em pequeninos.
Inventar uma palavra por acreditar que assim se aumenta a dignidade da mulher que exerce o cargo, não me convence.
Mesmo nada!

Pé-de-Cereja

9 comentários:

meri disse...

Tens toda a razão! Também não me convence!
E fizeste uma pesquisa e tal, para esta entrada :) Parabéns

Mary disse...

Tem piada que nunca tinha pensado nisso nesses termos.
Tenho de reconhecer uma coisa: sou mulher e bem defensora dos seus direitos. Parece-me óbvio que apesar dos incontestáveis progressos na matéria ainda não temos as mesmas oportunidades. Vai levar muito tempo... mas ( o fatal mas) sempre achei uma bizantinice aquela coisa do arroba para descrever amigos e amigas, professores e professoras, trabalhadores e trabalhadoras...
Para quê complicar, como dizem na anúncio?...

Mary disse...

Que engraçado entrar ao mesmo tempo que a minha homófona (?)
Vivam as «méris» madrugadoras!!!

Joaninha disse...

As «meris» foram de facto madrugadoras para um feriado, caraças!!!
Ora aqui está uma questão que não pensei que se colocasse a sério. A minha mulher-a-dias fala muitas vezes na sua chefa, e sempre me reprimi um sorriso quando a oiço. Também imagino que ele fale na presidenta. Mas para mim eram plebeísmos que até davam graça ao seu modo de falar mas não eram para seguir.
Se bem entendo, aqui trata-se de outra coisa, considerar que esse possível feminino de uma palavra reconhece que o cargp pode ser exercido por uma mulher.
Bem.....

cereja disse...

Nem de propósito, hoje parece que são só mulheres que passam por aqui! Será magia?
:)
Mas gosto que passem, atenção!
E que comentem como têm feito.

Alex disse...

Queridissima,

Conheces-me mais do que o suficiente para saberes que a atitude de sabichona não me cabe, a minha estatura não conseguiria abarca-la mas no caso não posso deixar de chamar a atenção para o seguinte:

Presidente é aquele ou aquela que preside a algo, não é "aquele senhor" ou "aquela senhora", é quem pratica o acto de presidir; Logo não faz sentido pensar em termos de "presidento" ou de "presidenta".

O "Priberan" diz, está bem, presumo que assuma a palavra como todos nós quando nos referimos a alguém que preside, como que fosse uma "qualidade" dessa pessoa e não o "acto" que pratica. Ok, entende-se.

fj disse...

Apoio.

cereja disse...

Olá fj.
Lacónico, mas cá tomos um homem afinal...
'Brigada pela visita ;)

cereja disse...

Querida Alex, não sei porquê tinha esquecido que conhecias este blog. Que parva que fui, até estás ali nos 'seguidores' e tudo!!!!!.
Quanto ao tema, o que dizes vem inteiramente de encontro ao que penso. Estranhei de facto o dicionário, mas podes ter razão na explicação que dás.
Também considerei que "presidente" ó "aquele ou aquela que preside" aliás no texto que escrevi dei outros exemplos, como "gerente" ou "residente" ou "agente" e podemos ir por aí fóra... Estranhei a posição da minha amiga, que é mulher muito inteligente e culta, como 'lhe-deu-para-ali' :) Era para apoiar a senhora em questão, eu percebi isso que não tinha nada a ver com gramática como ela escreveu, e sim era outros conceitos. Só que não consegui concordar, daí o desabafo neste meu «espaço de conforto» que é o blog
;)