quarta-feira, 29 de maio de 2013

Vemos o que nos convém ver


Cada vez parece mais que vivemos em vários níveis de realidade. 
Não devia estranhar porque se calhar sempre assim foi. A realidade vivida pelo escravo não tinha nada a ver com o mundo do seu dono, ou o mundo feminino não  é  era  o mundo dos homens, assim como a vida aos olhos das crianças não é a que os adultos vêem. Mas é impressionante reparar que pelo menos hoje em dia, em Portugal, podem existir tantas diferenças de perspectiva entre cidadãos adultos. E afinal basta mudar a perspectiva de trabalhador, consumidor, para a de patrão ou gestor. Muito interessante.
E reparei nisto mais uma vez, a propósito da EDP.
Uma notícia, diz-nos que
 Não nos surpreende. Afinal, todos pagamos as contas ao fim do mês e tínhamos reparado. A factura que se paga pela electricidade é enorme e por mais que procure gastar menos a coisa parece não ter grande efeito para diminuir esse valor.  Depois, quase em simultâneo lemos a interessante opinião do Mexias que diz que não senhor, é mentira, o que subiu muito foi a água, combustíveis, gás, mas a electricidade não. E mais diz: " se não tivermos em consideração os impostos, a electricidade em Portugal é mais barata".
É a visão dele. A visão do consumidor de um bem para o qual quase não tem escolha (que os fornecedores estão unidos entre si) é a factura que tem de pagar. Se para além do produto electricidade, ou gás ou água, paga também taxas e impostos que quase duplicam a conta, isso é irrelevante. Sabem que para ter aquele produto têm de pagar uma quantia importante. E que isso tem subido na proporção em que o seu salário tem baixado. E é essa imagem que conta.
 

 imagem daqui

Pé-de-Cereja

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Obsessivo-compulsiva?

características (?) defeitos (?) enfim certos aspectos-do-nosso-comportamento que saem fora do padrão da 'normalidade' e parecem perfeita maluquice a quem está de fóra. Claro, há coisas que são mesmo patológicas como a acumulação compulsiva, a disposofobia que implica não conseguir deitar nada para o lixo, ou o oposto quando o excesso de arrumação e limpeza pode ser também uma doença, uma neurose obsessiva-compulsiva. Nas pessoas "normais" (?) estas facetas podem existir em doses suaves. Gente mais desarrumada, ou demasiado arranjada, que gostam de tudo muito limpo, ou se sentem mais confortáveis com alguma confusão.
Confesso que eu alinho pelo campo da "arrumadinha". Não me sinto bem com as coisas muito tempo fóra do lugar, e chateio um pouco [acho que é só um pouco] quem vive comigo. As minhas gavetas andam arrumadas, os cabides virados para o mesmo lado, as roupas ordenadas por cores ou por tamanhos. É muito fácil encontrar uma coisa cá em casa, porque há uma lógica. E embirro solenemente quando quem passa a ferro dobra os lençóis de qualquer maneira porque na prateleira caiem uns por cima dos outros, e quase sempre os desdobro e volto a dobrar. OK, sei que pode ser uma obsessão, mas sou assim :)
Contudo, afinal pode-se ser bem pior! Na excelente série Downton Abbey  havia um momento, no genérico, em que se assistia ao pormenor da cerimónia de pôr-a-mesa e o responsável por essa operação usava uma fita especial para verificar que a distância entre os talheres e os pratos era igual. Tinha de estar per-fei-to.

Mas era uma história passada quase há 100 anos. Qual não é o meu espanto quando há dias encontrei uma imagem, que mostra a colocação das chávenas de chá nas bancadas do parlamento nipónico, usando o mesmo método da fita. Ora então! E se a chávena ficasse uns centímetros desalinhada, mas que falta de respeito...!!!
 Fiquei animada. Afinal as minhas obsessões com as coisas alinhadas e certinhas ficam muuuito longe daquilo.
Sou normal!



Pé-de-Cereja

sábado, 25 de maio de 2013

A linha que separa Arte Urbana de Vandalismo

Li esta manhã uma notícia que me remeteu para  para outra e esta veio recordar  ainda outra. 
Complicado isto.
Pintar nas paredes não é de agora, muito pelo contrário. Os murais que são uma magnífica forma de arte, já existiam na antiguidade. E houve famosos pintores de murais. Mas...
A verdade é que desde que inventaram a lata de spray para a tinta, tudo levou uma grande volta. Quando eu era criança, se me desse na cabeça pintar uma coisa num muro tinha de arranjar um pincel e uma lata de tinta - que se podia entornar e era tudo prejuízo. E era  caro! Quando muito escrevia-se na parede com carvão, mas nada que se compare com o que aconteceu com o advento destas técnicas modernas. Muito prático, permite que grupos à compita entre si, muitas vezes com uns copos ou uns fumos a mais, entrem em roda livre e, de lata em punho, caiam em pleno vandalismo. Muitas vezes preciso de sinais de trânsito, placas informativas, monitores de multibanco mas vejo-os inutilizados por pinturas. Outras vezes vejo prédios acabadinhos de pintar, já irreconhecíveis por pinchagens grosseiras e feias. E caixotes de lixo. E cabines telefónicas. E janelas de comboios. 
É certo que há a outra faceta da moeda. Os graffiters que desenham mesmo a sério. Que deixam paineis que merecem respeito, que devem ser preservados. E isso é o que é complicado, porque um anti-graffiter possuído de raiva já não distingue nada e se começa a limpar leva tudo a eito, mesmo o que que se trate de um trabalho bom e interessante.
Mas a questão é mesmo separar as águas. Onde termina a pintura e começa o vandalismo...? Porque, sejamos francos, 90% do que se vê é vandalismo puro e simples!!! 
Será que os que percebem da coisa, não poderiam dar umas aulas, em atl por exemplo, para mostrar como-é-que-se-faz?... E, sobretudo, como e onde é que NÃO SE FAZ.



sexta-feira, 24 de maio de 2013

Resmunguices sobre independência

Ontem fui capaz de fazer sozinha uma coisa que sempre tinha pedido para ma fazerem. E até costumo pago para isso, é claro.
Fiquei contente. Orgulhosa de mim. E a partir daí pensei em várias coisas relacionadas com a educação:
Sabemos que a raça humana é aquela onde o indivíduo leva mais tempo a amadurecer, a chegar a adulto, a ser independente. A maioria dos animais depois de uma pequena fracção do seu tempo de vida, deixa de precisar dos pais. Anda, voa, nada, encontra comida, defende-se, ataca... O ser humano não. Vai precisar de muito tempo até estar de facto autónomo e independente. Quase um quarto da  sua vida!
E é essa a função dos pais. Gerar uma criança e dá-la à luz é importante, mas ensiná-la a sobreviver sozinho é ainda mais importante.
E eu encontro muito, muitíssimo, pais que adoram os filhos e muito receosos de que algo lhes aconteça  os poupam à aprendizagem da vida. Fazem tudo em vez deles, dão-lhes o peixe já cozinhado e sem espinhas, não a cana de pesca.
Ensinaram a andar, a falar, a comer pela sua mão, a ir à sanita. Até os mandam à escola. Mas a mãe dá-lhes banho, veste-os, ata-lhe os atacadores, corta-lhe a comida aos bocadinhos. Não arriscam nada, não experimentam o fracasso, a protecção é total. O mundo é perigoso, está bem. Mas a selva também é perigosa para os que lá vivem e os animais mais fracos sabem fugir, esconder-se, defenderem-se... Eu cada vez vejo mais meninos que vivem em casa como no hotel, a cama aparece feita, as coisas arrumadas, a comida na mesa, a loiça e a roupa lavadas, e isso é tão normal como abrir a torneira e sair água. Meninos? Muitos já o foram, mas passaram a adolescentes, a jovens adultos. E não sabem - nem querem saber - desses 'pormenores'. Nem o preço dessas coisas comezinhas como o pão ou o leite. Alguém o põe na mesa, como se nascesse em cima da toalha.
Sou uma chata com isto, mas considero que ser um erro de educação cada vez mais generalizado. E, naturalmente, se eles não sabem fazer ou fazem mal as tarefas mais corriqueiras, muito menos aquelas que pedem algum conhecimento. Cozer a roupa, fazer sopa, pequenas bricolages, são mundos desconhecidos. E o caso é que se, ou quando, falha o apoio familiar é um desastre. Perde-se, no mínimo, muita qualidade de vida.
Falo por vezes com mães a quem aconselho que 'soltem as crianças', peçam-lhes que vão fazer pequenas compras para casa, responsabilizem-nos por tarefas comuns, não ocultem os seus erros. Tudo isso é uma aprendizagem que lhes vai servir no futuro. Aprenderem a ser independentes, não precisarem do suporte dos outros.  Afinal a generosidade destes pais é enorme mas estão a roubar-lhe um bem muito valioso - o prazer de saber que são capazes
O tal prazer que eu senti ontem!



Pé-de-Cereja

domingo, 19 de maio de 2013

Ainda sobre comentários

A semana passada escrevi aqui uma coisa que teve poucos comentários directos, a não ser os meus próprios a esclarecer alguns pontos. Digo comentários directos porque tive um amigo que me perguntou aonde é que eu queria chegar, se era alguma coisa em especial que me tivesse irritado. Mas não, aquilo era mesmo um desabafo em geral...
Contudo, tropecei de novo num "comentário" irritante e não resisto em voltar ao assunto: Foi num artigo da Visão com o título
Um iluminado, deixou esta resposta paternalista: "...a realidade é que não consigo (porque não tenho) gastar mais... Mas se fizermos as contas, sem grandes excessos, podemos fazer não uma mas várias refeições por esse valor. Um pacote de massa ou arroz, um pouco de carne picada ou peixe ou até uma boa panela de sopa de legumes, de certeza que fica abaixo dos 2 euros e rende mais que uma refeição. O problema é que ainda há muito boa gente que não quer ter trabalho na cozinha e prefere pré-cozinhado ou ir à tasca da esquina comer uma sopinha..."
Primeiro, leu mal. Não eram 2 euros (aliás menos, porque se refere a 2 dólares) por refeição e sim por dia. O que muda bastante, porque essa quantia será repartida por 3 refeições pelo menos, que é o que se costuma e deve comer diariamente.
Portanto esta criatura afirma que não tem mais para gastar do que esse dinheiro, (60 euros por mês em comida!) , mas lê os jornais na internet?! OK. Fecha-se os olhos a isso.
Mas os seus conselhos, deixam-nos boquiabertos - com menos de 2 euros "faz uma boa panela de sopa de legumes que rende mais que uma refeição"? Só uma nota de quem faz realmente compras: com esse dinheiro pode comprar 1kg de batatas, a única coisa barata (66 cêntimos) e depois pode escolher, a) couve (lombarda, 1,49 ou penca 1, 67) mas já ultrapassa b) agrião 1,99, também ultrapassa c) nabiça 1,61, ná, é demais, d) bróculos, 2,50, ui, ui e) feijão verde 2,60 um luxo f) nabo 1,31, óptimo, já quase chega ao orçamento ou g) cenoura 55 cêntimos. Bingo!!!! A tal boa-sopa-de-legumes que lhe vai servir de pequeno almoço, almoço e jantar, é feita com batata e nabo ou batata e cenoura...
Porque ele acha que a questão é que "ainda há muito boa gente que não quer ter trabalho na cozinha"...
Acontece que eu sei e até gosto de cozinhar. E concordo que a comida pré-cozinhada (alguma) é mais cara e se pode poupar nisso. Mas há muita gente que simplesmente não aprendeu, não é por indolência que o não faz é porque o não sabe. Por outro lado os valores da proposta não têm a ver com a nossa realidade e o comentador só provou que nem sabe ir à praça!!! Nem sabe ler bem, porque se é "por dia" engloba o pão, o leite, alguma fruta.  Tudo por menos de 2 euros?!?! Perdeu uma boa ocasião de estar calado não escrever nada! 




Pé-de-cereja

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Futebol, patriotismo e bom senso

Venho falar de coisas que não percebo bem.
Futebol.
Evito falar, de uma forma geral, de coisas que não entendo. Como essa coisa da fé. Falo pouco de religião a não ser quando ela vem embirrar comigo, porque não entendo bem (nem mal) um sentimento que... não sinto. E esta espécie de fé num desporto, está um pouco no mesmo patamar. Aquilo ultrapassa-me, mas como estou em minoria reservo a minha opinião, não quero ofender ninguém sem necessidade. Aliás, por simpatias familiares - ou o inverso, porque em criança a escolha fez-se por provocação - até gosto de um clube 'dos importantes' e tomo até algum partido.
Mas, de vez em quando, o caldo entorna-se. 
A semana passada até parecia que a vida do país tinha parado por causa de uns jogos de futebol! Foi interessante? Foi. Serviu também para aliviar outras tensões, foi um escape de que se precisava? Também. Mas com calma...
Do primeiro jogo, já tudo foi dito. Não devia ser uma guerra do norte contra o sul ou vice-versa, mas até parecia. OK. Também achei graça a algumas coisas e ao drama do que não passou de um jogo de futebol, mas enfim...
Contudo, no jogo Benfica - Chelsea desfraldou-se a bandeira do patriotismo. De um modo alucinado, como se fosse um jogo da selecção nacional! Veja-se a amostra de uma reportagem de uma TV nacional onde a jornalista parece ter perdido a noção do que devia dizer
E é isto que me faz espécie.
Tenho a ideia, embora possa estar enganada porque isto não é a minha praia, de que os clubes dantes representavam zonas de um país, bairros, cidades, agremiações locais. Tinham jogadores que muitas vezes tinham começado por jogar lá como crianças e depois continuavam no clube. Ou não, mas a 'prata era da casa' podia ser trocada, empenhada, mas era coisa interna.
Hoje, olho para o plantel como se diz creio eu, dos clubes que jogaram esta semana como se ali estivessem a Inglaterra e Portugal personificados e vejo que nos 2 casos, de 25 jogadores, 18 são estrangeiros. (???!!!)  Acima de 2 terços. Recordo uma piadinha ouvida já há anos num jogo deste tipo onde alguém afirmou "eu cá, em jogos destes, apoio sempre os portugueses; por isso torço pelo ****" - claro que a piada é que o **** tinha em campo muito mais portugueses, que o "nosso" não tinha nenhum...
Pois é. Quando há um jogo entre um clube português e outro estrangeiro, prefiro que ganhe o português. Seja ele qual for.  Mas é um jogo de um clube, não é a selecção. E mesmo quando se trata da selecção, não é a Batalha de Aljubarrota!





Pé-de-Cereja 
 

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Passado versus futuro...?

Escolhi este texto porque foi o último que vi, mas vem na sequência de vários outros muito semelhantes. [o facto de este estar em francês pode parecer um tanto snob, mas é simplesmente por ser o que encontrei mais à mão :D ]
Gostei, 'partilhei-o' no facebook, identifiquei-me bastante. Tudo isto é verdade. As gerações mais velhas foram criadas sem tecnologia. Educadas de um modo mais espontâneo com as diferenças de hierarquia familiar bem definidas. Havia mais liberdade e facilidade no convívio directo entra as crianças. Era diferente o que "podia fazer mal" ou "devia fazer bem". 
É verdade.
Mas não será esta mesma visão do passado um recomeço? Recordemos o "Meia-noite em Paris" ou outro filme, este muito antigo,  "Les belles-de-nuit" com um tema aproximado: o passado pode ser lindo mas é-o sobretudo nas nossas recordações... Porque curiosamente se recuarmos até à nossa infância encontramos lá quem resmungasse que no seu tempo "é que era!" e assim sucessivamente. Olhando bem o que vemos agora é a importância da tecnologia e o que isso implica, é certo, mas pouco mais.
Os nossos jovens comunicam por internet com pessoas estranhas. Na minha adolescência, eu correspondi-me com um jovem francês da minha idade, cujo contacto obtive não sei bem como, e essa correspondência semanal era bem divertida. Nunca pus em dúvida o que me contava mas claro que podia ser mentira - a não ser o viver em França por causa dos selos. A motivação era bem semelhante à dos miúdos de hoje. 
Realmente não havia "gel anti-bacteriano" como se fala ali em cima, nem outros exageros, mas havia muitos outros cuidados sobretudo por causa da tuberculose. Hoje vejo beber pelo copo de outra pessoa, que era coisa que nunca se fazia na minha infância. Nem provar de outro prato. Parece-me que muitas vezes se está a comparar a infância de uma criança no campo com a vida actual de uma criança na cidade...
Nessa altura havia talvez menos perigos sociais, mas as crianças se calhar por serem menos protegidas sabiam defender-se melhor. Contudo, isso ensina-se e treina-se, está nas mãos dos pais, não é uma fatalidade.
Porque a verdade é que o ser humano não é assim tão diferente, mesmo que os instrumentos se vão aperfeiçoando e a velocidade de tudo seja bem maior. Recordo umas férias em que mantive uma acesa discussão com um colega que as tinha ido passar à terra: várias cartas por semana, cheguei a escrever e receber cartas todos os dias, afinal sms...mais desenvolvidos e mais lentos mas era o mesmo princípio.

Enfim, o nosso presente é o passado do futuro, não é? Mas vamos mantendo as recordações, um campo polvilhado com uns pózinhos de beleza.

Pé-de-cereja 
 

segunda-feira, 13 de maio de 2013

A asneira é livre

É uma frase velhinha esta. A asneira é livre.
E até é, essa não paga imposto. Mas não devia ser... Se há coisa que que não devia ser livre era a asneira!
Ora bem, eu vez em quando faço um disparate, e sou burra porque já sei  o resultado e juro depois que não volto a cair noutra, mas... Ou seja, quando há uma notícia especial ou que me interessa um pouco mais, sinto curiosidade por ver o que os outros pensam daquilo e espreito os comentários que lá deixaram os leitores anteriores. Quero eu dizer, espreito os primeiros, uns 3 ou 4, porque me ponho rapidamente logo em fuga.
Já sei, já sei, já sei!!! Quem me manda a mim? Só tenho é que ficar quieta e ler apenas o que vem no corpo da notícia, quando muito passá-la ao facebook e dizer lá da minha justiça. Mas tenho recaídas.
Sempre funestas.
Tenho a convicção de que aceito sem grande dificuldade opiniões diferentes das minhas. Vivo em sociedade, não é? Claro que discuto, e com energia, para defender o meu ponto de vista mas tenho de aceitar que haja quem pense rigorosamente o oposto acreditando todos nós estarmos cheios de razão.
Mas os comentários dos jornais, senhor!!!!! Para além dos  fabulosos erros de português, quer na sintaxe quer na ortografia (o que é mesmo desleixo porque hoje todos os computadores têm corrector ortográfico) a linguagem usada de uma grosseria extrema, muitas vezes com palavrões grosseiros a acompanhar, e as ideias expressas, é tudo de deixar de boca aberta.
Na maior parte dos casos, contrapõem ao relato do jornalista a sua opinião baseada no "porque-sim". Não se dão ao trabalho de explicar porque dizem aquilo, embora por vezes se perceba que emprenharam de ouvido e é um dos muitos boatos que correm até  sem o menor fundamento. 
E choca-me. É bom que haja liberdade de expressão, e parece interessante que com as novas técnicas não seja preciso "a carta ao director" para qualquer um ver publicado o seu pensamento.  Mas não assim!
Assim sente-se é vergonha. Este é o povo a que pertenço?!
Pronto, enquanto me lembrar não volto a abrir aquelas nojentas caixas de comentários. Enquanto me lembrar, que como comecei por dizer ciclicamente recaio nesse disparate. BURRA! 








Pé-de-cereja

domingo, 12 de maio de 2013

Para além das palavras

Com a situação actual que nos tem abanado brutalmente, comecei a pensar como atrás do abanão económico vem a nova aprendizagem de mentalidades. Difícil. Mudar profundamente nunca se faz da noite para o dia mesmo que seja para redescobrir novas formas de pensar. E, sobretudo, é ainda mais difícil quando vai ao arrepio do que se aprendeu em criança.
A actual geração de adultos nasceu com (ou um pouco antes, ou um pouco depois) o 25 de Abril. Que foram anos de folga económica não apenas em Portugal, mesmo no resto da Europa promovia-se o consumo. Certas profissões que se baseavam na reparação de objectos quase desapareceram porque se algo estava estragado substituía-se por um novo. E toda a gente procedia assim! Recordo quando há vinte e tal anos, recém chegada a Macau, perguntei a uma local se sabia de um sapateiro, a sua expressão de espanto e desdém Olhou-me como se eu fosse uma sovina mesquinha "Quele arranjale sapato?! Eu deito fóla!!!" - a surpresa da minha mesquinhice aos olhos de alguém que ganhava mal!
E foram muitos anos assim. Gerações de crianças que pediam "compra-me" e não o mais antigo "dá-me", porque sabiam que o que desejavam vinha de uma loja. E quando apareceram os ATMs, pediam para ir buscar ali dinheiro como quem vai buscar água à fonte - daquela caixinha saía dinheiro. O consumo era furiosamente estimulado e "parecia mal" aproveitar-se. Se está estragado deita-se fóra, se está velho deita-se fóra, se é novidade compra-se logo. E foi toda uma geração educada deste modo.
Agora quer-se inverter a marcha. Mas nem sabem como, porque 'o truque' não é comprar mais barato, mas não comprar de todo e aproveitar-se o que se tem. A palavra já tão gasta do poupar deve ser trocada por aproveitar. Não apenas a comida porque isso é uma evidência, mas tudo o que usamos! 
Aproveitar
Os restaurantes já têm caixinhas para se trazer para casa o que sobrou das travessas. Vemos por aí balcões de costura, para aproveitar a nossa roupa que não está bem. Passamos livros de mão em mão. Voltou-se a mandar arranjar aparelhos estragados porque é "um pouco" mais barato do que comprar novo. É toda uma mentalidade que se está a formar.
Já encontrei um retroseiro onde uma senhora ainda sabe como se viram os colarinhos e os punhos das camisas e já lá deixei umas.
Aproveitar. Como no tempo do pós-guerra. Porque esta guerra é feroz e com vítimas mortais. 



Pé-de-Cereja 

sábado, 11 de maio de 2013

Actualizando as parábolas

Esta 6ª feira assisti a um colóquio na Gulbenkian, com o nome de  "Mobilidade social e desigualdades em tempo de crise" promovido pelo Monde Diplomatique e o CES. Diz-se tanta coisa hoje em dia, a informação que corre por aí é tantas vezes 'adaptada' às nossas ideias preconcebidas, que sempre que posso gosto de ouvir quem sabe mais. E foi interessante. Foi muito interessante para mim ouvir falar do fenómeno vozes não-portuguesas, que estudavam a crise duma perspectiva não nacional.
E achei muito curioso saber que um dos factores que tem atenuado um pouco a violência desta horrível crise económica é a existência nos países do sul de uma tradicional solidariedade familiar. Foi lá dito que nesse aspecto Portugal vai muito à frente, à frente até da Itália que também apresenta valores elevados dessa solidariedade  (mas foi lembrado que a Itália são 3 países: a Itália do sul onde esses valores são fortes não tem nada a ver com a do norte e talvez nem a do centro...) e esse factor explica porque é que as vítimas do pavoroso desemprego ainda resistem - porque se abrigam sob o tecto dos pais.
Sabemos isso. Há 100 anos ou mais, quem não tinha bens nem vivia de 'rendimentos', sabia que os seus filhos eram o seu seguro de reforma. Uns pais com vários filhos, ao chegar a velhos tinham a confiança de que teriam abrigo e alimentação junto deles. A tal parábola do pai muito velho que é levado pelo filho para morrer longe e corta ao meio a manta que este lhe ia deixar, era bem sentida. Ninguém aceitava essa imagem.
Mas deu-se uma reviravolta social de 180º. Já não são os filhos adultos que apoiam os pais e sim os pais que ajudam os filhos crescidos e até os netos, com aquilo que ainda têm. Quem corta agora a manta ao meio para tapar o filho do frio, é o pai velhinho.
Ou seja, esta fúria cega contra os aposentados (que nada produzem, dizem) é uma pedrada que pode vir a ter um ricochete inesperado. Esse auxílio do mínimo dos mínimos - a metade da manta - que os velhos desta terra ainda podem prestar às pessoas que amam, pode desaparecer.
..........................
E depois?
Quem pode prever a continuação? 


Pé-de-Cereja
 

segunda-feira, 6 de maio de 2013

O dono da bola

Uma história que me contaram ontem veio relembrar uma dúvida que tenho: 
Há um "hábito" muito curioso na relação entre o Estado e quem trabalha com ele como independente. A pessoa faz o trabalho para que foi contratado e no final supõe-se que deverá receber a verba que foi ajustada para esse trabalho, mediante a qual passará o respectivo recibo. Pelo menos é o que é lógico. Se vou a uma loja fazer uma compra, entregam-me o produto perante o pagamento e, por ter pago, devo exigir depois que me passem uma factura, um recibo, não é?
Pois, mas quando a mercadoria é trabalho não é assim. Primeiro oferece-se a mercadoria. Depois de a ter recebido, usado, confirmado que está em condições, exigem uma factura um recibo em como se recebeu o dinheiro (que não se recebeu!). E algum (ou bastante) tempo depois lá se vem a receber o dinheiro correspondente ao recibo que já se passou...Estranho? Pode parecer mas para os inteligentes das secretarias isso é o normal. Para se poder ser pago por aquilo que já se fez, temos antes de mais nada assinar um documento em como ... já se foi pago!!!
Já há uns anos, aconteceu-me o caso interessante de ter pago IRS sobre uma quantia que ainda não tinha recebido nem vim a receber tão cedo, mas o imposto já lá cantava porque eu tinha passado o famoso recibo!!! 
Este esquema sempre me fez impressão, porque notava uma grande desconfiança em relação ao prestador do serviço que, pelos vistos poderia de má-fé dizer que não tinha recebido o seu pagamento, mas exigia uma confiança cega no patrão - pois também poderia acontecer que, de recibo na mão, fugisse ao pagamento afirmando já o ter feito... Mas são as normas que desde há muito regem os pagamentos que o Estado pratica.
Acontece que esse modelo agora se pratica em muitos sítios. O tempo pode ser curto,  até pode ser logo no dia seguinte, mas só se deposita o dinheiro na conta de quem passa um "recibo verde" se já está passado o recibo dessa quantia.
E ontem discutia-se à minha frente o caso de alguém que trabalhava para uma instituição privada, e muito interessante por sinal, mas que desde há 5 meses que ia passando os recibos sem que recebesse nadinha em troca! É certo que era um trabalho que só ocupava algumas horas por semana, não era em full-time nem era a única fonte de receita dessa pessoa, caso em que seria gravíssimo, mas não é isso que está em discussão, é a justiça de se passar um recibo antecipadamente. A declaração de uma mentira, que se recebeu X, quando isso não aconteceu.
Vejo sorrisos dizendo que não é importante. A mim parece-me que é. Como podemos ter confiança se a base é de mentira? Enfim, quem manda é o dono da bola...


Pé-de-cereja