quinta-feira, 28 de abril de 2011

Diferenças

(cliquem para poderem ler)

Por mim acho que a imagem nem precisa comentários.
Estive a guardar revistas antigas e encontrei aí uma dúzia ou pouco mais de números (não lhe posso chamar 'colecção' infelizmente) de um jornal infantil. De 1937. Entre textos giríssimos, encontrei alguns conselhos para fazerem brinquedos. Aqui está «um carro de assalto».
E o que os miúdos se divertiam, heim?!
Não quero desmerecer dos brinquedos actuais; é claro que existem alguns sensacionais, mas... Não será que aqueles que foram feitos com as nossas mãos têm um sabor diferente? Juntar as caricas para fazer uma corrida com piparotes certeiros não era bom? Aprender a costurar fazendo um vestido de boneca, um fazer um jantarinho com ervas e pedrinhas faziam-nos participar de um modo muito mais activo.
... Que saudades.


Pé-de-Cereja

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Há 37 anos (*)

(*os subtítulos são links para o original)


Dormíamos quando o telefone tocou.
Estava ainda escuro. Tínhamo-nos deitado tarde e pensávamos fazer uma pequena viagem nesse dia pelo que a primeira ideia quando ouvi a voz da minha sogra era que seria qualquer recomendação, porque ela era muito «sogra galinha» e demasiado protectora. Contudo o ‘recado’ era bem diferente: «Liguem o rádio. Depressa! Passa-se qualquer coisa de grave, tenham juízo e não se atrevam a sair de casa!»
Ligámos de imediato o rádio e realmente algo de estranho se passava. Dava apenas música, sem qualquer intervenção do locutor habitual, e a música era exclusivamente marchas militares. Eu tinha 25 anos, o João 26, casados há poucos meses, unidos por muito afecto e idêntica visão do mundo e da sociedade. Olhámos um para o outro. O coração bate forte quando ouvimos «Aqui Posto de Comando das Forças Armadas». Pensámos em Kaulza…Seria uma viragem à extrema-direita?... Coisa tenebrosa de imaginar mas o «golpe das Caldas» tinha falhado há pouco tempo…
Arranjámo-nos e vestimo-nos num ápice. Ficar em casa?! Nunca. É certo que era essa a recomendação do tal «posto de comando» e da nossa 'mãezinha' mas isso era completamente impossível. Tínhamos que saber o que se passava, mas tendo vivido toda a vida com as maiores cautelas não nos atrevíamos a telefonar aos nossos amigos, sabíamos bem que os telefones podiam estar em escuta e não era seguro.
Saímos com o nascer do sol e nervosíssimos. Adeus viagem, queremos lá saber, isto é muito mais importante. Pouca gente na rua, tudo parecia calmo. Demos uma voltinha de carro e olhámos um para o outro com a mesma ideia: Vamos à Baixa!
Chegamos ao Rossio, vemos os tanques, o coração parece um tambor a querer rebentar-me o peito. Ouve-se conversas e começamos a acreditar que não é um golpe de direita, então…? Será?...
Passa-se palavra de que o Carmo está cheio de gente, querermos ir para lá e já nem conseguimos passar. Subimos a Rua Garrett, vemos gente a rir, falamos uns com os outros, de repente esquece-se a cautela, esquece-se a PIDE. O tempo passa, são já 9, 10, 11 da manhã, agarramos cravos vermelhos que as vendedeiras de flores do Rossio oferecem.
Vivemos um sonho, ou o acordar de um longo pesadelo!




Eu era miúdo. Dez anos acabados de fazer. Tinha ido como de costume para a Escola mas via-se que alguma coisa se passava, os professores estavam esquisitos só a falar uns com os outros e não vinham para as aulas. Alguém fala em Revolução e não era a brincar. Os professores discutiam, uns achavam que se devia dar as aulas como de costume, outros que era mandar os alunos para casa. Eu via bem a discordância, uns radiantes, outros muito preocupados.
Mas a meio da manhã foram os pais que começaram a aparecer a ‘recolher’ os filhos, era mesmo uma Revolução! Eu nunca tinha visto tanto nervosismo. Os meus pais pareciam outros, eles que são – eram! – calmíssimos, estavam numa pilha de nervos.
Meteram-me no carro e vão a casa dos meus avós contar as notícias. Ainda têm algum receio de falar ao telefone e é mais seguro ir lá a casa ver como estão. Na estrada, no caminho da marginal, passamos por um sítio onde de avista o Forte de Caxias e o meu pai às tantas grita “Que se lixe, quero lá saber!” e buzina vigorosamente. Outros carros passam por nós e também começam a buzinar; um deles buzina de um modo especial, os meus pais explicam-me que aquilo é «morse». A minha mãe chorava de emoção e repetia-me para nunca esquecer aquele dia, o fascismo estava a cair. Sentia-me contagiado com aquela excitação, e ainda por cima não tinha tido escola!
Lembro-me que os meus avós, que tinham mais de 60 anos, não queriam acreditar. Eu sabia que eles sempre tinham sido de esquerda e combateram com todas as forças o salazarismo. O avô esteve preso muitas vezes. A conversa é entre a incredulidade e o riso, percebo que se está a viver um momento sem par. O meu avô quer vir logo para Lisboa, e querem deixa-me ali com a avó, coisa que não me agrada, perdia a festa!
Almoçamos a correr, parece que estamos nas nuvens. Oiço nomes: Marcelo, Tomás, Spínola. Mas onde está o governo, o que é que ele faz? Prendem-no? Julgam-no? E a PIDE? Vão prender os Pides?
Vimos todos para Lisboa depois do almoço. No rádio do carro ouvimos que o forte de Peniche foi libertado.
Todos gritam: Desta vez foi! Esta é a prova!




A minha avó morreu há pouco, com 80 e tal anos. Tinha uns 55 anos quando foi o 25 de Abril, eu ainda não tinha nascido. É engraçado porque ao ouvir o que ela me contava desse tempo e o que contavam os meus pais, até parecia que se estava a falar de países diferentes.
O meu avô, que já tinha morrido, era um legionário e a minha avó estava perfeitamente integrada na sociedade de então, o tal Estado Novo. Considerava que tudo estava bem e, para ela, a minha mãe tinha sido ‘desviada’ do caminho certo pelo meu pai, que ela olhava como um perigoso revolucionário.
Nesse dia, ela só soube que havia alguma coisa de errado pela criada que lhe veio dizer que na praça se falava em revolução. Ligou o rádio e as notícias deixaram-na assustadíssima. Telefonou a várias amigas que ainda a assustaram mais, falavam em fugir, ir para as suas casas de campo, que os revolucionários iam matar toda a gente. Rezou a Nossa Senhora, fez promessas, a meio da tarde estava aterrada sem saber o que fazer.
Foi quando chegaram os meus pais com a minha irmã pequenina, todos bem dispostos, para lhe dar um beijo. Pôs aos gritos:
“ - Que é que fazem aqui!!! Vão já para casa! E ainda por cima com a menina, desgraçados, inconscientes! Olhem que corre sangue nas ruas…”
“ - Oh mãe, ponha-se calma! Quem é que lhe disse essa?!”
“ – É que vêm aí os comunistas e matam toda a gente! É uma revolução!”
“ - Pois é, é uma revolução mas não morreu ninguém. Correu tudo muito bem” Começou por não acreditar. Aquilo eram “coisas do genro” com certeza. Contudo a calma com que ele falava, deu-lhe alguma tranquilidade. Se calhar as coisas não estariam assim tão mal como ela receia.
Desconfiada voltou a ligar a televisão depois deles saírem. Que esquisito. Está tudo a passar-se ao contrário do que pensava. E… enfim, se calhar agora o seu sobrinho já não ia para a guerra, o que a andava a ralar muito.
Contudo a minha avó resmungou o resto da vida, e eu gostava dela mas era um pouco irritante estar sempre ‘do contra’, sempre à procura do que estava mal.
Só que, naquela tarde, teve de reconhecer que as coisas não foram como ela receava.


Nessa altura eu tinha quase 16 anos.
Já tinha experimentado as dificuldades de formar uma Associação de Estudantes no meu liceu. Tinha lido muitos livros emprestados, discutia noites inteiras com os meus amigos, era uma bomba de emoções prestes a rebentar. Sentia-me revoltadíssimo com a situação do país e assustado com a perspectiva de ir para a guerra.
Aquele dia foi um sonho para mim. Desde manhã que andava na rua com o grupo dos meus amigos e amigas. Éramos muito novos, mas loucamente entusiasmados. Íamos encontrando outros grupos, de malta do cineclube, do club de jazz, da pró dos liceus, e íamos engrossando o grupo que já era enorme. Trepávamos aos Chaimites, que dantes nos metiam medo por significar guerra e morte, e agora nos traziam a paz. Estava tudo enfeitado de cravos vermelhos, um acaso que se tornou um símbolo.
Vivam os cravos! Viva o MFA! Viva a Vida! Viva a Liberdade!
Gritávamos palavras de ordem que se inventavam na altura, e recuperámos «o povo unido jamais será vencido» do Chile, o pobre Chile, na altura sob a pata de Pinochet. E a emoção de comprar jornais que traziam na primeira página: «Este jornal não foi visado por nenhuma comissão de censura». !
Claro que não havia telemóveis na altura, portanto para falar para casa andávamos a juntar moedas para ir a uma cabine. A minha mãe queria-me em casa, mas eu desobedecia: «Oh mãe!!! Hoje, que caiu o fascismo?! Hoje não me acontece na-da!!!» A minha namorada não conseguiu falar da cabine mas falou do telefone de uma loja, porque naquele dia todos facilitavam, todos estavam solidários. Nunca se viu coisa assim!
Finalmente ‘desmobilizámos’ para jantar, também tínhamos fome.
Mas combinámos dar a volta aos pais e encontrarmo-nos depois do jantar. Havia tanto que discutir, que saber, que planear… Sabíamos que a vida estava verdadeiramente a começar.


Onde estavas na noite do 25 de Abril?

Chegámos à noite a casa, eu e a Marta, completamente extenuados. Cansadíssimos os dois, e ainda debaixo de choque. Ainda nos custava acreditar. Na nossa vida tinha ficado para trás muitos anos de luta activa, desde a “crise académica de 62”, onde nos conhecemos e começámos a namorar. Dessa época ficou a «greve de fome» feita na Cantina, a prisão em Caxias. Qualquer de nós tinha conhecido como era uma cadeia por dentro…
A nossa vida tinha sido muito difícil até então. Sempre que nos candidatávamos a um emprego, apesar de licenciados, a má informação da Pide tinha-nos bloqueado as hipóteses de um trabalho de jeito. Aquele dia foi vivido como um sonho. Voltámos a casa estoirados, cansadíssimos, e fomos enfiar a nossa filhota na cama, que também ela se sentia contagiada pelo ambiente de excitação.
Mas a porta ia ficando aberta para os muitos amigos que iam aparecendo. E foram imensos os que se juntaram na nossa casa, onde improvisámos um 'jantar' - havia pão, ovos, queijo, chouriço, vinho e cerveja, não era preciso mais! Cada qual que chega trás notícias, boatos, nem se sabe bem o que é a verdade e o que são os nossos desejos… - Eh malta!! Shee!!!!Tudo calado, vão dar as notícias na TV!!
De súbito aparecem as imagens da Junta de Salvação Nacional . Ai!O quêêê??? Desaparecem os sorrisos, passa um arrepio, um momento de susto. Spínola, Galvão de Melo, Pinheiro de Azevedo, Silvério Marques e Rosa Coutinho. Ali, até mesmo o Rosa Coutinho parecia ter má cara! Naquela sala tão animada e feliz sentimos passar uma aragem fria… Foi a primeira desilusão do dia, mas em breve ultrapassada. O Zé Pedro, optimista, acha que aquelas imagens são necessárias para tranquilizar as pessoas mais assustadiças. “Vamos animar, malta, olhem que quem controla o Movimento não são ‘estes’!” e de novo o tom das conversas sobe, planos, sonhos, enchem de entusiasmo o nosso grupo, igual a muitos outros espalhados àquela hora por todo o país.
Ninguém tinha sono, quem conseguia dormir na noite de num dia assim?...



Pé-de-Cereja

Festa

               (por favor cliquem na imagem para ficar do tamanho certo) 


Pé-de-Cereja

domingo, 24 de abril de 2011

Filho de (peixe) gata, sabe (nadar) ser esperto

O segundo post que deixei neste blog, em Outubro do ano passado, era em homenagem à esperteza de uma gata. Uma história autêntica e muito engraçada.
E afinal a inteligência herda-se.
Essa esperta gata, teve filhotes. E, continuando a ser esperta, decidiu dar um para adopção àquela minha amiga. Portanto, a A. que nunca tinha tido animais de estimação, viu-se dona de um gatinho minúsculo e desde logo ficou derretida com ele, como quase sempre acontece. 
Aliás o bicho é mesmo um encanto!
E, quando nos falamos ela tem várias histórias engraçadas para contar. 
Esta contou-me há pouco:
A casa dela tem um grande terraço. De manhã o gatinho vai dar o seu passeio ao ar livre e despede-se da dona. Tem um ritual - anda um pouco, olha para ela a ver se é acompanhado, espera uma festinha e lá salta para o muro para desenferrujar as pernas.
Ultimamente tem chovido, e as coisas alteram-se um tanto.
Ontem, ela abriu-lhe a porta mas não saiu com ele explicando «Ná. está a chover!» e ele renhaunhau, mais renhaunhau, grande insistência. E ela repete, com autoridade: «NÃO! Está a chover!!» e sai dali.
Eis senão quando sente uma marradinha na perna e vê que ele correu para ao pé do suporte dos guarda-chuvas, olhando-a em expectativa.
Ora pois! Ela estava a fazer-se de parva ou quê?!

Pé-de-cereja

Recordações

Hoje é Domingo de Páscoa.
Também é 24 de Abril.

O que quer dizer que fará amanhã anos que caiu o fascismo em Portugal No meu velho blog durante todo o mês de Abril deixei posts a relembrar o que se tinha passado e o que era a vida «dantes». Escrevi uma série deles, um por cada dia, numa espécie de Diário de uma mulher jovem, igual a milhares de outras, durante o mês de Abril de 74. Chamei-lhe «O Diário da Ana» e se quiserem passar por lá podem ler a série toda.
Na véspera, a 24 de Abril, ela teria escrito assim:
Quarta-feira, 24 de Abril de 1974

É já amanhã que estreia no Londres o «Hiroshima, mon amour». Durante algum tempo imaginámos que este filme nem cá viesse, mas afinal enganámo-nos.

Não vamos à estreia mas estou muito desejosa de finalmente o poder ver! Já tem uns aninhos e estava já a pensar que nunca mais cá chegasse. Ele recebeu o prémio da crítica em Cannes, e foi nomeado para o Óscar do melhor argumento, mas Portugal está fora do mapa...

O Paulo tinha-o visto em Paris e ficou entusiasmadíssimo. O Resnais é um realizador excelente embora 'difícil', desde «O Ano Passado em Marienbad» que eu fiquei seduzida por um lado e com respeito também. Penso que só ele para pegar naquele texto da Marguerite Duras (que o texto-guião já a gente conhece…) e criar um filme que todos dizem ser sensacional, de mistura entre o passado e o presente, entre o Japão e a França, uma mistura de guerra e de amor.

Vamos ver se não o cortam muito, porque o Paulo disse que há umas cenas que podem vir a ser censuradas pela nossa púdica censura. De qualquer forma é para maiores de 18, mas enfim mais que isso todos nós temos!

Este fim-de-semana estamos a pensar em ir até ao Algarve dar uma volta e avaliar as hipóteses de começar a apalavrar uma casinha de pescador para as férias de Verão. Estamos já quase em Maio e se deixamos para muito tarde depois torna-se mais difícil. E sabia bem uma voltinha e mudar de ares. Vamos ver se dá.

(Estamos quase em Maio, e ainda hoje veio no jornal, numa noticiazinha muito discreta, dizendo que tinha havido uma «manifestação subversiva na Cova da Piedade»; depois de analisada essa 'terrível manifestação' tinha sido o lançamento de panfletos a «convidar a população a manifestar-se no 1º de Maio» segundo o Diário Popular. Quando pensamos que noutros países o dia até é feriado!)

De qualquer modo, se estiverem interessados nestas memórias passem pelo Pópulo e escolham a 'categoria' Abril.
Enfim, Boa Páscoa!

Pé-de-cereja



sábado, 23 de abril de 2011

O calendário e a motivação

A zanga costuma ser contra as famigeradas «pontes». Quando um feriado cai numa quinta ou terça, e o trabalhador gasta um seu dia de férias naquele dia de trabalho ali encalhado, costuma-se bramar contra esse despautério. Cita-se o exemplo dos países onde, quando o calendário determina esse tipo de feriado, empurram-no para junto do fim-de-semana. De uma forma geral, essas pessoas iradas costumam ignorar que nessas terras quando o tal feriado cai no fim-de-semana passa para um dia útil... 
Mas desta vez o escândalo foi sobre algo que, desde que me lembro, sempre aconteceu: haver folga quinta-feira santa à tarde para serviços não essenciais. Como se o ano passado, e o outro, e o outro, e o outro, e o outro, não tivesse sido assim!
Já tinha pensado em escrever qualquer coisa sobre isto, quando reparei que quer a Didas: Expliquem-me como se eu tivesse cinco anos com uma idade mental de dois, se faz favor quer a Saltapocinhas que pede, Gostava que me explicassem ...como se eu fosse muito burra tinham focado o caso ironicamente, queixando-se de que não entendiam.
Pois é. Também acho que essa treta dos tais 20 milhões que se gastaram é só para “dizerem coisas”. Lembrei-me de uma historieta bastante antiga que já nem sei reconstituir muito bem, mas era mais ou menos assim:
Um empregado foi pedir aumento ao patrão.
«Aumento?!» escandalizou-se ele. Você tem semana inglesa portanto não trabalha 104 dias por ano, só trabalha 261.
E só trabalha 7 horas por dia, um terço do dia, ou seja uns 89 dias.
E tem ainda 30 dias de férias, portanto ficam uns 59 de trabalho. Mas não trabalha também no Natal, Páscoa, Dia de Ano Novo, e mais aí uns 10 feriados de dias históricos ou religiosos, o que reduz o seu tempo de trabalho a pouco menos de 2 meses. Se descontarmos o tempo, em que vai à casa de banho, atende chamadas, tosse, responde a perguntas de colegas, vem receber ordens ao meu escritório, tenho de concluir que você praticamente não trabalha vai ter de me indemnizar pelo tempo que perco a responder!
É que essa do dinheiro que se ‘perde’ foi muito repetida mas muito mal explicada. Que uma fábrica, se parar um dia, baixe com isso a produção, entendo. Mas pouco mais do que isso, em quase tudo o resto o que está em jogo é a competência, motivação, vontade. E isso não se avalia com o relógio ou calendário. Mesmo quem olha de lado para a Função Pública no seu aspecto mais burocrático, sabe bem que um funcionário interessado e competente pode despachar 10 casos enquanto o seu colega resolve 2. E se pusessem o incompetente a trabalhar o dobro do tempo, ele resolvia 4 casos! 
Não é o tempo que importa é o conhecimento e competência. É o modo como as coisas estão organizadas. Não é significativa a diferença de tempo que se trabalha “lá fora” até pode ser menos, mas é certo que se trabalha mais e melhor. 
Porque será?

Pé-de-Cereja

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Arrogância



«Todo o burro come palha…» (a questão é saber dar-lha) ou seja na arte de dar a palha ao burro reside o segredo de muito sucesso. A palha é seca, pouco saborosa, e o burro sabe que há uns alimentos bem melhores, mas com uma festa no lombo, e uma cenoura lá no fundo da alcofa sempre marcha a palha. Se a palha é proposta com um cacete na mão - ou comes ou… - talvez o burro atire com um par de coices…
Muito bem. Os argumentos de alta economia, não os entendo. Reduzo muito o que oiço aos conhecimentos necessários para gerir as contas da minha casa, o que é errado, bem o sei. Mas é isso que posso entender, eu e muita gente.

Já há uns anos, o país andou com as finanças muito atrapalhadas e, juntamente com a ajuda económica, veio a intervenção do FMI.
Não é novidade. Já passei por isso e lembro-me bem do medo que tivemos. Agora, um, dois, três, cá está ele outra vez. E veio acompanhado. Mal acompanhado. A palha é sequíssima e há demasiado chicote.
Mas é a postura destes senhores que é inacreditável. A palavra arrogância que me ocorre é fraca para definir a atitude: olham para os povos que vão "aconselhar" desdenhosamente como de raça inferior, uma corja de inúteis mandriões que só se desenvolvem com rédea muito apertada. P.I.G. O que se pode fazer com um porco?

Ainda por cima, encontram um povo que, saberá Freud porquê, tem uma fraca auto-estima. Ouvimos a toda a hora falar na “dívida externa”. Coramos de vergonha! Mas… os EUA não têm a maior dívida externa do mundo?! E andam envergonhado? Oooooh! Se calhar a questão não está aí.
O nosso Estado gasta muito? Não sei se é muito, talvez nem seja, gasta é mal. Uma terra onde os pobres estão mais pobres mas os ricos mais ricos, está mal gerida. Só pode ser. E, curiosamente, estes senhores tão desdenhosos, não pretendem exactamente dar uma esmola O dinheiro que aí vem tem um juro bem alto (5,5%!!!) - não praticam caridade, estão aqui para ganhar dinheiro. E vão ganhar: 3.470 milhões de euros :(
Mas  o conselho a ordem que me parece ouvir não é para aumentar empregos e produção, é o oposto. Quem me  avisa ordena assim, meu amigo não é.

Pé-de-Cereja

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Outros Tempos

Não me considero saudosista.
É certo que recordo algumas coisas com ternura, e terei saudades dos momentos bons da minha vida, de pessoas que desapareceram, de locais onde me senti bem, de livros, músicas, teatro, cinema, viagens, enfim de alguns momentos bons. Mas, sei que não sou saudosista e quando comparo momentos passados com o presente tenho em linha de conta que a vida hoje é melhor, de uma forma geral, do que foi há umas dezenas de anos. E digo apenas 'dezenas de anos' porque não posso recordar como era há cem...
É melhor a esperança de vida, a alimentação, o vestuário, os transportes, a medicina, as comunicações.
E até a mendicidade ou como se lhe queira chamar.
Quando eu era criança pedia-se «um tostãozinho». Mais modernamente pede-se «uma moedinha» (sempre em diminutivo, que fica melhor) porque assim já o pedido se adapta à variação do câmbio.

E ontem aconteceu-me o inédito: vinha na rua quando um rapaz de bom aspecto, com um telemóvel muito bom na mão, se me dirige dizendo em voz alta «a senhora podia dar-me 25 cêntimos para poder tirar o carro da bomba?» (creio que disse cêntimos mas confesso que podia ter ouvido mal) Ainda olhei a ver se era uma gracinha e ele estivesse a rir.  Uma praxe qualquer. Ná, estava sério e nada comprometido.
Como??! Foi meter gasolina no carro? Faltavam uns cêntimos? Veio para a rua pedi-los a quem passava? Com um telemóvel de luxo na mão? Ou aquilo era um modo mais elegante de pedir a «moedinha»?
Não sei. 
Talvez a pessoa atrás de mim lhe desse o dinheiro em troca de uma boleia...

Pé-de-Cereja

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Balançando


Na Europa o grupo dos países nórdicos, através de uma política social-democrata (nada a ver com a ‘social-democracia’ desta nossa terra) era considerado quase um paraíso na terra do ponto de vista de políticas sociais.
A Suécia, com o primeiro lugar no Índice de Democracia, a Noruega, onde o Desenvolvimento Humano atinge também o primeiro lugar, a Dinamarca, país com o mais alto nível de igualdade de riqueza do mundo e o menos corrupto  do Mundo ex-aequo com a Suécia e Nova Zelândia -  em 2008.
A Islândia, tem aparecido muito nos sites e facebook como exemplo de rebeldia, era em 2007 o país mais desenvolvido do Mundo, segundo o IDH, da ONU e o quarto maior PIB per capita do planeta; no ano seguinte depois do colapso do sistema bancário, teve uma queda a pique recusando contudo agora a que todo o povo seja responsabilizado pelo erro dos bancos.
A Finlândia, país que também presava o Bem-estar-Social, parece que anda farta desse Bem-Estar e hoje faz parangonas devido a uma ascensão espantosa das forças da direita (os «Verdadeiros Finlandeses» ena!!! Como afinal a cantiga é igualzinha em toda a parte...) – o que vai fazer alterar ainda mais todo o quadro que existia sobre estes países nórdicos..
A verdade é que parece que os povos vão dando por adquirido esse aspecto tão importante para quem o não tem, de Bem Estar Social. E, como isso nem se põe em causa porque já cresceram com esse dado, olham agora para os impostos quem têm de pagar, e ... não gostam. A verdade é que não se pode ter o sol na eira e a água no nabal. 
Vemos agora, estes países – Dinamarca, Suécia, Finlândia – irem deslizando para governos que lhes podem responder aos desejos imediatos. Vamos ver como vai ser o seu acordar.

Pé-de-cereja 

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Paroles, paroles, paroles...

Gosto de conversar.
Gosto mesmo muito. É certo que também aprecio o silêncio, também sabe muito bem estar ao pé de uma pessoa com quem nos entendemos mesmo sem palavras a apreciar o sossego do silêncio. Contudo, de um modo geral, sou faladora e aprecio muito a conversa.
Mas...
Tudo o que é demais, enfim, é demais! Assim à primeira vista até parece que as pessoas de hoje têm medo do silêncio. Sem querer armar-me em «interpretadora» quase me apetece imaginar que haja para aí medo de pensar, receio dos caminhos aonde nos podem levar os pensamentos quando não os estamos a partilhar com outrem.
É certo que as actuais tecnologias ajudam-nos a andar meio caminho. Meio? Dois terços ou mais! O telemóvel é um objecto completamente indispensável em todas as idades e classes sociais, e usa-se de um modo que gera dependência: sair de casa sem telemóvel faz-nos ficar de ressaca. O pior castigo que se pode dar a um filho é tirar-lhe o telemóvel.
É evidente que se vê com mais facilidade o exagero do vizinho do que o nosso, mas quantas ‘conversas’ não ouvimos nós num transporte público, na rua, num café, seja onde for que estejam pessoas e haja rede, que parece mesmo que falam para... não estarem calados.
«Olá! O que estás a fazer? Ah! Pois. A Rita já chegou? É, é cedo para já aí estar. Hoje está mais frio. Não achas?! Se calhar estás mais agasalhada do que eu. Eu tenho uma camisola fininha. Sim... [silêncio] Pois. Nem por isso. Olha, contaram-me uma muito engraçada [segue-se uma anedota] Olha parece-me que tenho aqui uma chamada a entrar, eu já te ligo» e atende uma outra chamada com a mesma conversa de chacha. Muitas vezes nem sei como a bateria aguenta chamadas de meia hora – não pensando já na conta que está a pagar - desde a entrada no autocarro até à saída num fim da carreira.
Se reparem bem em cada dez pessoas com quem se cruzam numa rua, umas oito estão de telemóvel colado à orelha ou, noutra versão, a carregar velozmente nas teclas trocando mensagens.
Anteontem entrei numa loja de bairro, pequenina, muito simples, e o senhor estava em frente de um pc a conversar via skype decerto. A conversa era do tipo da que referi. «Ah, então está tudo fino? Pois, o calor veio para ficar, aqui também. Tens visto o Esteves? Ná, foi só para perguntar. Eu estive com ele há pouco tempo» depois lá olhou para mim de sobrolho levantado porque como ia fazer uma compra cortava-lhe a conversa. «Espera aí, que já volto» Lá me vendeu o que eu precisava e voltou a sentar-se «Mas conta-me coisas. O que é que tens feito? Ah, ah, ah! Sempre és um malandro. Não pá, estou à vontade. Olha, sabes que...» etc, etc. Conversa mole.
A tecnologia é excelente. Põe toda a gente a falar mesmo sem ter nada para dizer. Pois, como dizia a prima do Solnado que gostava muito de dizer coisas...

Pé-de-Cereja



segunda-feira, 11 de abril de 2011

Qual Salazar, qual carapuça!

Com o desespero que a situação actual promove, somado ao sentimento de desapontamento que tem vindo a crescer após o 25 de Abril por se confirmar que o mundo com que se sonhou foi apenas… um sonho, vamos ouvindo cada vez mais uma frase impressionante: «Isto precisava era de um Salazar
A frase, em tempos, era dita com um sorrisinho irónico por gente muito revoltada com alguma coisa que lhes parecia um abuso, mas tenho-a ouvido muito agora, numa versão superlativa «Isto nem com um salazar lá vai, só com vários!»
Tem algum interesse reparar como evolui a nossa linguagem e como um nome próprio passa à categoria de 'adjectivo'. Não faz parte das minhas memórias, tão remoto é, mas contavam os meus pais que eu em pequenina quando me zangava com uma boneca ralhava: «foste muito má! És pior que o Salazar!» uma espécie de irmão mais novo do Diabo. Na série do Harry Potter, o vilão inicial chama-se Salazar [Slytherin de apelido] e, de certo, não foi uma escolha ao acaso porque a autora viveu entre nós.
Mas, o tempo vai adoçando algumas imagens, e de «O Mal» passou a representar «o ditador», a seguir «firmeza política», «autoridade» e, neste momento, a palavra parece já querer dizer a força que traz a ordem ao caos.
Ou seja, já se passou muito tempo, e agora só não se reclama o Marquês de Pombal, também absolutista, porque já nem na memória dos mais velhos existe essa recordação, e nem seria a mesma coisa, mas...
Mas a verdade é que a democracia é ainda, afinal, «o pior sistema político, salvo todos os outros» dizia o Churchill se não me engano. Não se inventou melhor. Porque, afinal... Oiço dizer que queria «um salazar» à mesma pessoa que ferve de indignação (e bem) com decisões do PM Sócrates, por ele não ter ouvido as pessoas. Quer «um salazar», por exemplo, um professor que se manifesta legitimamente na rua quando afinal, se ele governasse teria de ter assinado uma declaração em como aceitava à priori tudo o que o governo fizesse. Deseja «um salazar» o motorista de táxi, que no tempo dele tinha a bandeirada ‘congelada’. Pede-se «um salazar» que imponha ordem… aos outros!
Quem não enxerga o que esse desejo tem de aberrante, imagine o que seria o monstro por que anseia agora virar-se depois contra os seus desejos. Já não seria bom, pois não? É que as ditaduras e os poderes totalitários têm isso de desagradável – são incontroláveis. São poderes que, uma vez desencadeados vão gerando autodefesas para se  manterem e destroem tudo à volta.
A actual democracia anda mal e sofre de corrupção? Também me parece. Mas o caminho para a consertar não pode ser saltar da frigideira para o lume
Um ditador? Não obrigado. Já provei e não gostei.


Pé-de-Cereja

domingo, 10 de abril de 2011

«... é de cabo de esquadra»

Oiço muitas vezes, de manhã, um programa(zinho) na Antena 1, chamado Lugares Comuns, que vai contando a origem de algumas expressões  usadas na linguagem corrente, muitas vezes já sem se saber bem como se começou a dizer tal coisa. Há  alguns  dias explicaram porque se dizia «ser de cabo de esquadra!» e eu tenho para comigo que, hoje em dia, já pouca gente o diz, muito menos sabe como nasceu. Muito bem, lá explicam.
E isto recordou-me uma historieta que se contava na minha família, história autêntica, acreditem!

Ia um meu (creio que) tio-avô a passar numa rua quando ouviu uns gritos. Parou, naturalmente inquieto, e verificou que era uma mulher que gritava pedindo socorro porque estava a ser agredida. A coisa parecia séria e ele correu a reportar a situação a um polícia que ia passando.
-Acuda, por favor. Está ali uma senhora a ser agredida e a pedir ajuda.
Ao que, muuuuito cautelosamente, o agente quis saber:
- E o que é que ela dizia?
- Sei lá o que dizia!? Gritava: Socorro, Ajudem-me, Aqui-d’el-rei, Acudam....
- Mas o senhor ouviu dizer «Ó da guarda»?
- «Ó da guarda»?! Eu sei lá! Pedia socorro, vá, corra para lá!
- Não posso. Só se ela gritasse «ó da guarda!»
- Essa agora?! E assim não vai?
- Não senhor. Só posso ir se a ofendida pedisse «ó da guarda»!
- Essa é de cabo de esquadra!!! Então fica aqui ?....
- Pois se ela não gritou «ó da guarda»...
- É de cabo de esquadra! Nem acredito!....
Resumindo, da terceira ou quarta vez que o meu familiar insistiu que era de «cabo-de-esquadra» o outro muito corado, lá foi tomar conta «da ocorrência». Só então o meu tio reparou que tinha estado a falar com um verdadeiro... cabo de esquadra!

Pé-de-Cereja

sexta-feira, 8 de abril de 2011

As iludências aparudem....

Aqui há uns tempos aconteceu-me um acidente parvo. Durante uma pane na electricidade aqui no meu bairro, pane muito demorada, tropecei no escuro na minha sala e dei uma queda que me deixou uma estranha nódoa negra. Qualquer pessoa que cai leva instintivamente as mãos à frente, portanto «aquela» nódoa negra era ‘esquisita’... Como me doía bastante, no dia seguinte fui ao Centro de Saúde que me recambiou para o hospital para fazer uma radiografia. Mas quer no Centro de Saúde quer no Hospital as pessoas que me atenderam para além de condoídas, talvez mais do que a lesão justificava, insistiam muito: «Caiu?! Mas como?.... Que estranho. A senhora esteja à vontade, o que nos disser é confidencial. Tem a certeza de que caiu?» o que me fazia oscilar entre a vontade de rir e a satisfação de verificar que estes serviços estavam mesmo bem atentos às situações de violência doméstica. Ainda bem.
Ora ontem, aconteceu-me um acidente ainda mais caricato. :)
Decidi desmontar uma daquelas molas que se colocam nas portas para as manter fechadas. Aquilo estava numa porta que era pouco utilizada e eu precisava de uma uma mola daquelas noutro lado e não queria gastar dinheiro. Não estive de modas, muito enérgica e despachada, avanço de chave de parafusos em punho. Era tarefa fácil. Eu sou um tanto convencida, mas a verdade é que me consigo desembaraçar bem nas pequenas bricolages domésticas e aquilo para mim era canja!
E era. Desde que eu não fosse estupidamente pôr a cara em frente da trajectória da dita mola, que mostrou a sua energia e valor saltando com uma força que nem me passava pela ideia e atingindo-me entre o nariz e o olho. Ao receber a pancada pensei «parti o nariz»! e corri a mergulhar a cara em água fria. Depois experimentei a ver se via, se o olho não tinha sido atingido. Estava ok. Uff... Já me podia punir e chamar-me 50 vezes palerma!
Mas, estão a imaginar a continuação? Fiquei, naturalmente, com este lado da cara inchado e negro e agora não me cruzo com ninguém na rua que não me olhe com comiseração, espelhando bem na cara «Tadinha! Sempre há para aí uns tipos muito brutos!...

Pé-de-Cereja 

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Blogs e redes sociais

Ora bem, a blogosfera é também uma ‘rede social’. Cada uma das redes que eu conheço tem a sua especificidade e é isso que as torna interessantes – ou não.


Eu deixei aqui o Cerejas em pousio, porque já não me apetecia esta comunicação, sobretudo na forma em que eu a praticava. Andei muito neura, e durante uns tempos fechei estas portas virtuais e só comuniquei (pouco) à moda antiga – cara a cara ou por telefone.
Depois a minha amiga, e ex-colega blogger, Isabel, insistiu comigo declarando que o ‘facebook’ é que era! Não queria outra coisa. Escrevia lá como no blog mas tinha outra repercussão. Era outro asseio...
Sou curiosa.
Experimentei.
Huumm…
Como diz o tal anúncio «não era a mesma coisa».
Sem querer dizer que fosse pior, simplesmente não é a mesma coisa!
Aqui é uma casa que é só minha, os textos podem ser grandes se me apetecer, os bonecos que servem para ilustrar o que escrevi encaixo-os onde me parece que ficam melhor, etc.
Mas é claro que o fb divulga isto tudo muito melhor.  Recebemos os comentários no momento. As pessoas podem interagir entre elas. É de facto uma rede com ligações que nunca mais acabam... Vantagens.
Portanto, ando a alternar, escolhendo conforme me apetece o melhor dos dois mundo- a blogosfera e/ou  uma rede social.
Vamos ver como me dou vou dar.


Pé-de-Cereja

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Uma espécie de metáfora

Tive ontem de sair de Lisboa, não muito longe mas ida teria de ser a uma hora onde o trânsito na estrada devia ser um pavor, pelo que preferi ir comodamente de comboio. Costumo fazer sempre assim, posso ler, ver a paisagem, pensar, sem ter de estar com a atenção na estrada ou arriscar-me a levar com um carro em cima.
À volta, não havia comboio à hora que me dava jeito e  assim decidi voltar de camioneta.
Olhava distraidamente pela janela ao atravessar os subúrbios da cidade de onde estava a sair, quando arregalei os olhos:
Um homem de meia idade, levando na mão direita uma bengala branca com riscas encarnadas, passava  sozinho destemidamente por entre os carros, que abrandavam muito ao reparar nele.
Várias dúvidas:
a) Seria mesmo um cego? Hoje não se vêem muitas bengalas daquelas. Contudo se fosse uma pessoa da província, como a localização indicava, talvez ainda a usasse.
b) Uma brincadeira? A idade que o senhor aparentava afastava um pouco essa hipótese. Um adolescente em plena provocação talvez usasse aquela técnica para chamar a atenção, mas um homem de meia idade?... Huuuummm…
c) Estaria inconsciente do local onde estava? Teria de ser também surdo, o que já é levar a coisa longe demais.
Se hesitei quando ia escrever ‘destemidamente’, é porque com todas estas dúvidas posso imaginar que ele até estivesse cheio de medo. Não sei. Afinal foi uma cena entrevista num curtíssimo espaço de tempo.

Mas, enquanto a camioneta continuava o seu caminho, eu ia pensando como aquela visão podia ser simbólica. Não será o que andamos a fazer? Os nossos governos, nós que os elegemos, o nosso comportamento no dia-a-dia, não será o do cego a atravessar sozinho uma rua movimentada munido absurdamente apenas da sua bengala?
E uma frase-feita teimava em aparecer «o pior cego é o que não quer ver»

Pé-de-Cereja

sábado, 2 de abril de 2011

Mania das arrumações

Eu acho que não tenho. Quero dizer, não tenho a MANIA. Mas sinto-me bem com as coisas arrumadas. Quando tudo à minha volta está num reboliço fico desconfortável. A não ser que seja uma coisa «artística», que seja uma desarrumação involuntária, então é diferente. Mas o certo é que de um modo geral gosto da organização.

Quando me sinto em baixo mas começo a desejar ‘subir’ um dos sinais é… começar a arrumar. Organizo-me por fora e por dentro. :)

Desta última vez, em que estive de facto muito em baixo, comecei a fazer paciências (ou puzles, também dá no mesmo). Era uma obsessão. Irritava quem estava perto de mim, porque em qualquer migalhinha de tempo, lá estava eu a «arrumar» as cartas, e ficava aliviada quando terminava a paciência.

Logo a seguir comecei com armários e gavetas. Deitei coisas fora, organizei os armários de novo, forrei gavetas e dividi-as por áreas, etc, etc. E ainda ando nessa. E, foi nessa mesma linha que decidi, «organizar» os amigos do Facebook : )

Quando há cerca de ano e meio aderi aquela coisa, deixei aqui na blogsfera esta opinião. Aliás ainda a mantenho. Mãe há só uma e amigos há meia dúzia…

Mas, é sabido, que a palavra ‘amigo’ no facebook tem outro sentido. E brincando, brincando, reparei que até eu ia a caminhar para a centena! Ups! E agora? Como é que encontro as pessoas que me interessam mais? E, portanto, arranjei os grupos. Há amigos que são virtuais porque nunca os ‘vi’ mas até considero que os conheço, colegas de blogs ou encontros na blogsfera. E grandes amigos - a que numa designação um tanto infeliz chamei «de primeira» (infeliz porque não posso chamar «de segunda» aos que não são tão próximos, era mal-educado) – com quem só por brincadeira comunico pelo FB uma vez que o meio melhor é o telefone!...

E pronto. Tudo arrumado. Nem tudo, é claro, há coisas que não consigo arrumar em parte nenhuma mas isso são outros Carnavais.



Imagem daqui

Pé-de-Cereja