terça-feira, 15 de novembro de 2011

Gente e robots

Quando eu era jovenzinha adorava ler ficção científica. 
Tinha toda a colecção argonauta, desde o primeiro volume! Aliás em ficção científica (e não só) sempre preferi ler a ver as mesmas histórias em cinema. Não sei porquê, o futuro em cinema é sempre escuro e deprimente. Em romances não, conheço alguns bem optimistas, onde se fala de sociedades, distantes é claro, quer no espaço quer no tempo, onde a vida é mais justa e mais fácil. Tão bom.
É, aliás, muito interessante ler algumas histórias escritas nos anos 50 ou 60 em que o futuro é muuuito distante, lá para o remoto ano 2.000 ou 2001, onde a vida é tão diferente e pode ser tão boa. Não se imaginou nada do que se passa hoje, mas fantasiou-se outras coisas muito interessantes.
E muitas vezes são histórias com robots, é claro. Não esquecer os robots.
Ora  estes pensamentos estas recordações vieram porque vou sentindo cada vez mais que os seres humanos estão a ser substituídos por robots. Não, não, claro que não são robots em forma de gente, são 'apenas' máquinas, mas vem dar ao mesmo. Quando eu era mais nova ao comprar o que precisava para o dia a dia, ia à mercearia, ao lugar de hortaliça, ao talho. Conversava com quem estava ao balcão que me pesava um quilo de arroz, ia buscar um molho de agriões, ou cortava 4 costeletas. Faziam as contas num papelinho, muitas vezes com a prova dos nove ao lado, recebiam o dinheiro, davam o troco. Havia calor humano, mesmo que demorasse algum tempo a ser atendida. Anos depois abriu um super (hiper?) mercado e era muito engraçado, íamos buscar às prateleiras aquilo que se queria, já pesado e embrulhado, e pagava-se tudo no final à pessoa que estava sentada à caixa registadora. Atendia-se muito mais gente em menos tempo e apenas com um empregado. Achei prático e até gostei.
Quando comecei a trabalhar, uma vez por mês ia ao meu serviço um senhor com uma pasta e muitos envelopes e pagava-nos o ordenado. Eu pegava naquele envelope e ia a correr ao banco depositar o dinheiro. Uns anos depois pediram-me o número da contra e passei a ter o dinheiro lá depositado no dia do pagamento. Muito bom, mais seguro e prático. Gostei.
Para comprar gasolina para o carro, ia até a uma bomba e o senhor que lá estava tratava desse fornecimento, mexia lá numas torneiras, metia a gasolina no depósito e nós pagávamos-lhe. Uns anos mais tarde aprendi, e afinal era fácil, pegar na mangueira indicada e vigiar os litros que iam entrando, depois era só ir à caixa pagar. 
Quando precisava de almoçar fóra de casa sentava-me a uma mesa, o empregado mostrava o menu, escolhia, traziam-me o prato, comia, pagava e saía. Tempos mais tarde apareceram uns locais onde só se precisava de pegar num tabuleiro, seguir junto a um balcão e tirar os pratos que se quisesse e no final pagar na caixa. Mais rápido e prático.
O gás, água, electricidade, vinha todos os meses um empregado à nossa casa que contava o que se tinha gasto e recebia o que devíamos do mês anterior. Perca de tempo. É claro que a contagem podemos fazê-la nós e o pagamento pode ser electrónico, ou até automático.
Tudo isto se foi dando quase sem se dar conta, com pezinhos de lã...  Mas foi crescendo e alastrando. No supermercado, os artigos que ainda têm de ser pesados, já se podem pesar nas caixas. Ou, melhor ainda, nalguns deles somos nós, os compradores que fazemos tudo: pomos no saco, pesamos, colamos a etiqueta com o preço, e vamos pagar à caixa, e temos até já a variante de ser o consumidor que passa o códigos de barras no leitor, espera pelo total, faz o pagamento na máquina e vai-se embora... Que tal? Mais uma vez, prático.
.......................
A verdade é que com este 'truque', fazer com que sejam os consumidores a trabalhar para si próprios, consegue-se maior rapidez sem dúvida, e... poupa-se imenso nos salários! Deixou de haver atendimento por seres humanos, servimo-nos a nós mesmos e a relação que temos é apenas com máquinas que não adoecem, não têm emoções, não têm problemas familiares. Se há algum engano a culpa é nossa, não é? as máquinas não se enganam.
É um clássico afinal - os robots ou os humanos manipuladores, vão expulsando para a marginalidade do desemprego os humanos excedentários.
Nesses romances que eu lia costumava haver um herói.
Onde está? 



Pé-de-Cereja

15 comentários:

Joaninha disse...

Olá! (Parece que volto a ter o hábito de passar por aqui quando ligo o pc...)
Ups! Afinal tenho uma coisa urgente e não posso deixar o comentário. Mas venho já!!!!

Joaninha disse...

Ufff... A gente põe mas o trabalho dispõe! Afinal tinha engatilhado algumas coisas que já me esqueci, bolas!!!
.............
De qualquer forma este post veio lembrar muita coisa. Realmente a relação era bem diferente quando havia gente e não máquinas. Evidentemente que quem manipula as máquinas é também «gente» mas...

cereja disse...

Realmente Joaninha vieste só 'marcar o ponto' :) mas soube-me bem. Quando puderes logo continuas - se quiseres.

Claro que não fiz uma lista exaustiva de tudo o que era tratado por pessoas e passou a sê-lo por máquinas.
Por exemplo, nos transportes. A gente entrava nos eléctricos ou autocarros sentávamo-nos e o revisor/pica-bilhetes vinha vender o nosso bilhete ao lugar. Havia dois homens, o condutor e o que vendia os bilhetes circulando entre os passageiros. Mais tarde passou a ficar sentado à entrada do transporte e quem entrava comprava-lhe o bilhete. Depois, passou a ser o condutor que fazia tudo, quando estava parado na paragem vendia os bilhetes a quem entrava. E por fim os passageiros compram antecipadamente em máquinas os bilhetes de que precisam!
E há muito mais situações destas em que pouco a pouco se foi mecanizando o atendimento.

sem-nick disse...

Ehehehe! Estou a gostar! Que revivalismo, caraças!
Olhem AQUI o alicate que 'picava-os-bilhetes' :D

Zorro disse...

Boa, sem-nick. Era mesmo isso.
Olha Cerejinha, por um lado «é o progresso», não é? Há coisas boas, e o ser mais rápido tem algumas vantagens. Mas por um lado exagera-se (os exemplos que dás começam bem e acabam em pleno exagero, às tantas uma loja pode estar aberta sem lá ter nenhum trabalhador!) e por outro fica-nos essa ideia amarga de que se está a poupar em salários o que quer dizer que há mais gente desempregada!

Zorro disse...

Um exemplo que me recordo é em relação aos Bancos e o papel do Multibanco.
É inegável a vantagem da existência do Multibanco. Funciona 24 horas por dia, e faz-se lá tudo e mais alguma coisa. Hoje não precisamos de ir ao Balcão do Banco para nada, quando muito um esclarecimento e é quando há alguma coisa estranha o que pode nunca acontecer. Acho que este ano NUNCA fui ao meu Banco.
Mas a relação desapareceu. Eu dantes conhecia as pessoas que me atendiam, sabia o seu nome e elas sabiam o meu. O Banco tinha uma cara para mim. Isso foi-se definitivamente.

cereja disse...

Pois é, deu-me para o revivalismo!
E sempre que abro aqui o blog e os comentários lembro-me de mais situações onde o contacto humano era bom e importante.
Exemplo: vamos hoje à FNAC e podemos sair de lá com um saco de livros mesmo que só lá estivessem clientes e nenhum vendedor... Entramos, passeamos entre os escaparates, pega-se no que se quer, vamos até à máquina que lê o código, metemos o cartão na ranhura, pagamos e saímos. Fácil.
............
Há 50 anos havia uma pequena livraria na Av. de Roma. O livreiro, magro, moreno, com ar muito sério conhecia-nos. Aliás íamos lá porque se passava palavra, e a primeira vez íamos acompanhados por algum amigo comum. Em voz baixinha, ele lá nos dizia que tinha chegado uma ou outra 'novidade' que nos passava, embrulhada, por baixo do balcão e nós guardávamos na pasta sem quase olhar para o embrulho que só desfazíamos em casa.
Assim comprei muitos livros importantíssimos. O livreiro chamava-se Barata.

méri disse...

Tens andado a rever o Olho Vivo??? :)
Abraço!

cereja disse...

Olá Méri|||
Pois é! Há coisas tão engraçadas que não «passam de moda»... Aliás o RTP Memória ainda dá para matar saudades de muita coisa também. :D

Anónimo disse...

Vou começar pelos comentários da Cereja que desta vez fez para aqui os adendas ao post que deviam era estar lá em cima. ;)
O velho Barata, hein? Mas a verdade é que também se actualizou e teve o seu império. Hoje vamos à Barata com cartão de fidelização etc e tal, e aquilo é alguma coisa de importante. Assim como a Livraria 111 no Campo Grande, que também nos vendia livros à socapa. Mas, tens imensa razão, e o teu comentário foi comovente deixou aqui um nó(zinho) na garganta...

Mary disse...

Não sei se tenho bem saudades, mas lá que era um mundo mais humano, isso era. Menos mecânico.
Mas hoje não se tem tempo para aquelas coisas e conversas mais ou menos demoradas. toca a andar que se faz tarde e mainada!

saltapocinhas disse...

o mundo atual tem muitas coisas boas, mas a maior parte são más.
se queres comprar algo mais complicado que a mercearia, raramente encontras um empregado que te saiba explicar qual é o melhor, como funciona, etc (isto se tiveres a sorte de encontrar um funcionário...)

desde que possa, procuro sempre comprar "à moda antiga".

cereja disse...

Bom dia Saltapocinhas! (gosto de cumprimentar quem vai passando por aqui, mesmo que seja só dizer olá...)
É mesmo isso. SE tiveres a sorte de encontrar um funcionário!!!
Uma das coisas que ainda compro «à antiga» podem não acreditar, mas são ferramentas, digamos assim. Tenho uma loja na minha rua, aberta há 50 anos ou talvez mais, que é exemplar. Só vou aos AKY's e lojas dessas como excepção. Esta loja, que tem agora ao balcão os netos do dono, depois de ter tido os filhos, para além da boa disposição com que ficamos pois eles estão sempre a brincar e com um sorriso quando nos atendem, sabem explicar e aconselhar de um modo sensacional. Eu meto-me a fazer pequenos arranjos na minha casa, exactamente porque lá me ensinam a fazer. Se têm pouca gente (o que é raro porque está sempre muito cheia!) chegam a exemplificar à minha frente como se faz para usar certas ferramentas. Este é um comércio à antiga como devia ser sempre.

Anónimo disse...

Os robots,as máquinas vieram subtituir o clor humao,ma na verdade o problema não está nas máquinas, mas sim naqueles que as inventaram para substuir os humanos. Está naqueles que nos elevaram a meros números numa equação numérica, e está nas pessoas que não olham a meios para atingir os seus fins e depois se escondem atras de uma máscara e fingem serem arautos de principios e bosns costumes, quando na verdade nada corresponde a realidade.Representam um papel...e sentem-se bem, com ele porque provavelmente na sua demência já não conseguem discernir a o que é verdadeiro do que não é. Não sabem ou não querem perceber quando chega a hora de se retirarem de cena e deixar o papel a quem de direito...essas pessoas prestam? Dúvido e muito. Por isso nesse caso, venha a ficção cientifica, sempre distrai e não faz mal a ninguem de verdade.Saudades de Juio Verne , entre outros...esses sim valem a pena...os humanos alguns que passem adiante...
Silvya

if disse...

O progresso instala-se assim como uma semente num vaso. Cresce, floresce e dá fruto saboroso.
Mas aí está outro desconforto do progresso, o sabor de coisas como a pêra-rocha não é o mesmo, nem perto! Graças às técnicas de frio, as pêras são bem tratadas, nem lhes dá o bicho...