domingo, 21 de janeiro de 2018

recordações

Deixei ontem no FB uma nota motivada por uma referência à Pastelaria Bernard mas o formato facebook é muito mais restritivo do que o blog de modo que venho espraiar-me por aqui, mais a minha casa...😉
A evolução do comportamento infantil da minha infância até a actualidade é impressionante. Claro que uma criança é uma criança, o que mudou radicalmente foi a sociedade. (ainda vou falar no «supernanny» mas não hoje)
Na década de 40 para uma criança como eu, era uma festa ir lanchar à Baixa. Não acontecia muitas vezes, os meus pais trabalhavam durante a semana e não nadavam em dinheiro, e as avós também não eram muito de sair... Mas havia um casal amigo dos meus pais, que vivia perto de nós, a casa de quem eu ia brincar, com a filha. 
A boa educação, algo rígida, reinava naquela casa que eu achava muito chic, com cortinas de veludo e cetim, móveis super-envernizados e bastantes dourados, duas criadas de farda e crista. A minha amiga era tipo menina exemplar. Todos usávamos bibe em casa nessa época, mas os meus eram aos quadradinhos, ou xadrez, para disfarçar as nódoas que eu lhe punha, enquanto o bibe da Milu era de piquet branco, com folhos e não se sujava!! Ela sabia as etiquetas sociais todas, e eu não. Numa das primeiras saídas que fizemos as 3 - a Milu, eu e a mãe dela, fui chamada à atenção porque balançava os braços a andar. Fica mal. Uma menina não anda assim, mantêm os braços junto ao corpo. Ui... Na vez seguinte a mãe dela ofereceu-me uma carteira pequenina mas como a das senhoras, para eu levar na mão e andar direitinha como-deve-ser.
Ora, neste ambiente, uma tarde fomos lanchar à Baixa! Estava radiante! A Pastelaria ou talvez Salão de Chá, era no Rossio creio, mas não era a Suiça. Depois de entrar descíamos uma escada muito elegante, o salão era em baixo e todo forrado a espelhos cor-de-rosa! Aaaaah! Lindo de morrer! Sentámo-nos a uma mesa, com toalha branca, e cheia de utensílios de prata (?) achava eu, chávenas de porcelana, tudo lindo. Fez-se o pedido, chá para a senhora e chocolate quente para as crianças, e um prato com bolos.
Era assim nessa altura, pedia-se bolos e vinha um prato com doçaria variada. O inconveniente é que como eram todos diferentes quem escolhia primeiro ficava em vantagem, mas é claro que se podia pedir ao empregado que trouxesse outro bolo... Já não sei se escolhi ou me calhou uma «tíbia», um bolo tipo eclair mas com uma ou duas bolas (cheias de creme, é claro) no extremo. Um belo aspecto, muito apetitoso. Lá comecei a manobrar o garfinho para cortar o bolo e a esforçar-me por fazer boa figura. Nota importante, eu teria nessa altura aí uns 6 anos. Eis senão quando, a bola da tíbia que eu queria separar salta-me do pratinho e vai aterrar na chávena de chá da senhora da mesa do lado!!!
Horror! Ia morrendo de vergonha. Estou a reviver a cena e ainda sinto um arrepio. Foi uma queda do céu para o inferno. De felicíssima fiquei apavorada. A coisa lá se compôs com ajuda do empregado que foi mudar a toalha, e apesar de tudo o meu anjo da guarda fez que o vestido da dama não ficasse salpicado. Mas o vexame, e o olhar de censura que recebi ainda hoje o sinto.
Outros tempos.
Muito diferentes. Mesmo muito.

Cereja

4 comentários:

meri disse...

e tão boas que são as tíbias, ainda hoje! Imagino o embaraço...

FJ disse...

Que força para 6 anos! :)))
fj

cereja disse...

Oh FJ, aquilo era falta de jeito, lá força não era :))

cereja disse...

Méri, era (e é) bom, mas daquela vez nem me recordo se acabei de a comer... Só queria esconder-me debaixo da mesa :)
Seria sempre embaraçoso, mesmo com os meus pais ou avós, mas com aquela dama perliquitetes foi um pesadelo!