sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

New age

Tenho andado a remoer sobre uma situação estranha que me deixa cheia de dúvidas sobre os limites das nossas convicções e até se pode considerar que essas convicções podem ir.
A história é a seguinte:
Uma pessoa que eu até conheci muito novinha mas como isso foi já há bastante tempo agora já deve contar mais de 50 anos, teve uma evolução curiosa. Era uma pessoa bem integrada socialmente, activa na sua profissão da área da educação, casou, teve um filho, foi promovida, tinha amigos, e embora eu passasse muito tempo sem a ver o que ia sabendo dela era no sentido de que estava bem e sem qualquer problema. Separou-se do companheiro ficando a viver com o filho, que entretanto também se tornou independente. Uma família afectuosa, uns pais impecáveis, cultos, inteligentes, tolerantes, uma irmã com um feitio diferente mas com quem tinha apenas 'os conflitos de irmãos'.
Víamo-nos aí uma vez por ano, e na última vez achei-a com algumas manias. A mãe disse-me que não a percebia ultimamente, tinha ido viver para longe numa espécie de volta-à-Natureza, e ria-se achando tudo aquilo uma maluquice.
Nessa noite conversei um pouco com ela e também fiquei admirada, pregou-me as vantagens de uma vida pura, sem nada de civilizado, nem água canalizada, nem electricidade, nem nenhum conforto moderno. Tinha comprado ou alugado uma quinta no Portugal Profundo longe de tudo, tinha uns convidados, comiam o que a terra dava, bebiam água do poço, nem sei se teciam a sua roupa. E meditavam imenso. As doenças tratava-as com cristais e pedras semi-preciosas: ágata, água-marinha, âmbar, ametista... etc, (são imensas) que tinham propriedades fabulosas. Não prolonguei a conversa convencida de que aquilo lhe ia passar... Encolhi os ombros pensando «maluquices da new age» (que de new não tem nada!)
Passaram-se alguns anos, o pai faleceu e a mãe está agora internada com umas das doenças neurológicas da idade. E contaram-me que ela se propõe raptar a mãe para a levar para o seu paraíso, coisa a que todos os médicos se opõem.
Compreendo que para uma fanática sincera seja uma decisão correcta. Mas tem de haver limites. Que ela acredite que está cheia de saúde devido aos seus cristais e vida saudável, é lá com ela e ainda bem. Mas forçar uma senhora de cerca de 90 anos a partilhar essa vida?! É essa linha divisória que não deve poder ser transposta.

Acho eu.



Cereja

2 comentários:

méri disse...

problema bicudo... essas manias,também conheço uma pessoa, não tão radical mas acreditando em pedras quentes, sinos e suas vibrações, substituição de certas medicações por produtos da natureza, não muito excessiva, mas demais para mim - não que não acredite que certa alimentação poderá substituir certa medicação, isso, para mim é claro, mas, como tudo, com "conta, peso e medida" como se dizia nos nossos tempos antigos

cereja disse...

Tal e qual.
Não tenho nada contra certas regras e por mim adoro a Natureza! Fujo da poluição das cidades sempre que posso. Mas...
Acredito na medicina ocidental. São anos, séculos, de estudos, análises, investigações, desprezados porque no Oriente se faz de outro modo? OK, se quiserem fazer também com um chá, uma pomada, um outro alimento, mas custa-me desprezar-se um produto fruto de uma investigação científica, por outro porque se diz que é natural. Mas é a minha opinião, somos livres. No caso que citei, choca-me uma senhora de 90 anos com Alzheimer avançadíssimo ser levada para um local de que não gostava quando estava lúcida, e completamente desconfortável.