quinta-feira, 31 de maio de 2012

Carências (?)


Como qualquer pessoa normal [ já se sabe que a Christine Lagarde não é normal ] fiquei estarrecida quando li no Público que «a Unicef concluiu que 14,7% das crianças portuguesas até aos 16 anos vivem abaixo do limiar de pobreza»  E isto com dados de 2009, antes do acelerar da crise económica. Senti um misto de vergonha e de horror, porque sou portuguesa e porque respeito e gosto muito de crianças. Como é possível?! Senti-me muito mal.
Para a minha imaginação, 'abaixo do limiar da pobreza' significa subnutrição, vestir com desconforto, ter uma má habitação. Quase 15% (nesta altura, se calhar, quase o dobro) é pavoroso.

Mas como li que por «carenciada a Unicef considera qualquer criança até aos 16 anos que não tenha acesso a duas ou mais de 14 variáveis consideradas “normais e necessárias” num país desenvolvido», fiquei intrigada e fui procurar quais eram essas condições, 12 das quais indispensáveis para escapar ao limiar da  pobreza.
As tais condições estão  AQUI  e, se algumas são óbvias como as 3 primeiras, outras dão que pensar:
 
1. Três refeições por dia
2. Pelo menos uma refeição por dia com carne, frango ou peixe (ou um equivalente vegetariano)
3. Frutas e legumes frescos todos os dias
4. Livros adequados para o nível de conhecimento e idade da criança (não incluindo os escolares)
5. Equipamento de lazer ao ar livre ( bicicletas, patins, etc.)
6. Actividades de lazer regulares (natação, tocar um instrumento, participar em organizações de juventude, etc.)
7. Jogos de casa (pelo menos um por criança, educativos, blocos de construção, de tabuleiro, de computador, etc.)
8. Dinheiro para participar em passeios escolares e outros eventos.
9. Um lugar tranquilo com bastante espaço e luz para fazer os trabalhos de casa
10. Ligação à Internet
11. Algumas roupas novas (não serem todas em segunda mão)
12. Dois pares de sapatos (incluindo pelo menos um par de sapatos adequado a qualquer tempo)
13. A oportunidade, de vez em quando, para convidar amigos casa para brincar e comer
14. A oportunidade para celebrar ocasiões especiais, como aniversários, festas, eventos religiosos, etc,
.....................
Fiquei perplexa.
Claro que este é um bom programa, e seria excelente que todas as crianças tivessem acesso a tudo isto. Mas considerar carenciados os meninos que não beneficiem de 2 ou 3 destes  pontos, parece-me um grande exagero. Como já disse os pontos sobre a alimentação são sensatos, e seria bom que não 'herdasse' todas as roupas dos irmãos, apesar de ser uma questão psicológica. Mas o ponto 5, o 6, o 8, o 10...?
Não sei como foi a investigação da UNICEF. Mas palpita-me que se disse muita mentira nalguns países...

Bicicleta? Patins?
 Talvez não seja indispensável para ser feliz


Pé-de-Cereja

  

12 comentários:

Joaninha disse...

Tenho de ler tudo com mais atenção e tempo (passei por aqui à pressa)
Mas dá que pensar, como dizes.
Para mim mistura-se alhos com bugalhos. Talvez até falte alguma coisa entre as que eu penso que são fundamentais, e depois tem outras que são utópicas como isso que apontas das bicicletas e internet para todas as crianças mesmo pequenitas.

Joaninha disse...

Só dizer ainda que este teu post é oportuno para mim porque fui das que embarquei logo na revolta e indignação sem procura saber mais.

cereja disse...

É isso também, Joaninha, misturar alhos com bugalhos, porque há coisas que são afectivas e outras económicas. Evidentemente que se pode pensar em «miséria de afectos» mas é evidente que não é isso que está aqui avaliado. E a miséria económica, como eu penso, está naquilo que é básico: alimentar-se bem com os alimentos fundamentais, vestir com conforto, dormir numa cama confortável, ter condições de higiene, poder estudar, poder brincar, estes pontos aqui focados não se imagina nem de perto nem de longe como miséria!!!

Zorro disse...

O absurdo nesta coisa toda é 'separar' a miséria ou riqueza das crianças da correspondente miséria ou riqueza dos adultos. Por isso isto tudo parece uma brincadeira.
Por experiência pessoal e por tudo o que observo em meu redor, considero que os meninos portugueses têm, de uma forma geral, até mais coisas do que os seus pais. por todo o lado vejo pessoas que escolhem para os filhos coisas bem melhores do que aquelas que querem para si mesmas.
O que este estudo (??!) vem dizer é que as famílias portuguesas vivem bastante abaixo do limiar da miséria.
Mas uma miséria do 1º mundo...

cereja disse...

Meu caríssimo Zorro, é isso mesmo que eu queria dizer. Os dirigentes da UNICEF, muito bem intencionados acredito, pairam num mundo irreal. Se queremos melhorar a vida das crianças não podemos deixar cair desta forma chocante a vida dos pais. Não podem existir pais desempregados a viver de ajudas e empréstimos, e providenciarem patins, net, e livros educativos sem serem escolares (que já são bem caros!!!) aos seus filhos.

cereja disse...

Aliás há para ali coisas muito curiosas. Como é que os Checos estão a seguir à Áustria e acima da Suíça. Alemanha e França? Tem um nível de vida tão bom? E a Hungria e Estónia acima do Canadá? É por isso que digo que de disse muita mentira ou o inquérito foi leviano.

fj disse...

ai,de certeza fj

Anónimo disse...

Realmente parece tudo doido ou a viver em universos paralelos!
Eu, tal e qual como a Joaninha, fui dos que se indignou lendo a coisa por alto. Aliás a nossa imprensa (a nossa e a outra!) tem muito talento em realçar o que pode chamar a atenção sem explicar depois nada em pormenor.
Por um lado entendo a UNICEF. A medida tem de ser diferente quando se avalia o primeiro mundo e o terceiro, tudo é relativo. Agora falar em MISÉRIA é uma coisa séria e grave. Como disseste e eu também o penso, miséria é comer mal, andar mal vestido, viver uma família num quarto, não haver condições de higiene.
Se é relativo, temos de ver de que país se está a falar e o que é «relativo» nesse país. Talvez Portugal na generalidade viva abaixo do limiar da miséria em relação ao 1º mundo!!!!

Anónimo disse...

Para se ver essa 'relactividade' queria deixar aqui um link, mas não sei se dá. Vou experimentar...

Anónimo disse...

é aqui:
https://fbcdn-sphotos-a.akamaihd.net/hphotos-ak-snc6/s320x320/248158_447132535299821_100000092363960_1712453_1023317880_n.jpg

Anónimo disse...

Quando li aquilo fiquei a pensar. O salário à hora refere-se ao mínimo nacional, com certeza, e não sei de onde vieram os números nem quem fez estas contas. Mas decerto reflecte a verdade, pelo menos o valor líquido daquilo que se recebe por cá é escandalosamente não comparável ao resto da Europa.

cereja disse...

Olá King!!!
Sou uma ingrata. Não respondo como deve ser aos comentários que vocês aqui deixam. :(
Muito obrigada, pelo comentário e pela achega que deixaste. Ajuda a perspectivar a coisa, não é? Como é que pode haver meninos de classe média filhos de pais 'pobres'!?...