quinta-feira, 5 de junho de 2014

Inversões de modelos

Quando se reflecte sobre educação, a educação social não a escolar, não se pode evitar que os nossos tempos de criança sejam usados como referência. Para qualquer de nós as recordações mais antigas estão envoltas entre o que se devia ou podia fazer, o bonito e o feio, afinal o "portar-se bem" para merecer a aprovação de quem gostávamos. As histórias que nos contavam eram moralizantes, os heróis bonitos.
O mundo tem girado muito depressa.
Felizmente que «papão» é hoje uma palavra que só se usa como símbolo, e muito pouco menos para meter medo às crianças. Um bom passo em frente. Mas, com surpresa, reparo que os padrões de beleza e os agrados infantis sofreram um desvio de quase 180º. Os desenhos já não são à Walt Disney, - Branca de Neve, Cinderela, Alice, Bela Adormecida, com heróis a condizer - muitos vieram do Japão, e o traço é mais perto da caricatura, olhos ou bocas muito grandes, muito musculados, meninas um tanto sexys... e o estranho é que o padrão de comportamento também deslizou muitos graus. Para além dessa coisa dos vampiros, de que mesmo crianças pequenas falam de um modo desenvolto, aceita-se como natural a morte dolorosa dos inimigos, não como fim de uma história mas como mais um episódio. Muitas vezes "os maus" são modelos, é bom ter medo, ou até o papão é o ídolo (?!) coisa extraordinária. Esta história recente conta que 2 meninas esfaquearam uma amiga 19 vezes tendo como modelo o «splender», pelo que percebo um perfeito monstro que tem tudo para tirar o sono, de medo, a qualquer um!
É certo que na vida adulta há quem admire psicopatas, quem bata palmas a assassinos, quem confunda valores. As crianças ouvem-nos dizer com amargura que muitas vezes ganham os maus, que a vida é injusta. Mas durante a infância faz sentido que os bons sejam vistos como bons e os maus como maus. Uma coisa é aceitar-se a diferença e considerar com os feios têm tanto valor como os bonitos, outra é sobrestimar os feios.
Esta história do tal splender, figura que nem conhecia, impressionou-me mais porque em pequenina tinha um «papão» no meu imaginário que era muito alto e magrinho (mas este é mais assustador ainda porque nem tem rosto!!!) e nem imagino o que seria encontrá-lo. O que se passa com estas crianças que se identificam com os papões? Afinal quais são os seus valores? Porque é que se riem com cenas de pancada?
Do ponto de vista de saúde mental não acredito que seja bom.Tenho de reflectir.


Cereja

2 comentários:

Anónimo disse...

O mundo ás avessas, sim.
Também me faz impressão essa coisa do belo-feio. Percebo que na estética de um adulto se possa pensar que o «bonitinho» não é o que é bonito, mas para uma criança admirar figuras muito feias é chocante para mim. Pode estar relacionado com os modelos de cantores ou actores, que também cultivam imagens sombrias e escuras. Isso passou a ser o bonito.

M.C.

cereja disse...

Sabes M.C. por um lado isto espelha também a sociedade dos adultos, aquilo de que se gosta hoje não é nada do que se gostava nem direi há cem anos, mas há 50... Mas o que se passa entre adultos, enfim, é discutível, mas cada um tem direito à sua opinião estética. Impressiona-me contudo esta coisa de crianças admirarem monstros. Na história da Bela e o Monstro, ele era um coitado que até era bom por dentro e mesmo assim é considerado estranho que ela tivesse gostado dele!