quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Brinquedos

Como qualquer educador dirá, Brincar é uma Coisa Séria.
No último século tem havido uma reviravolta notável na forma como o adulto encara o acto de brincar de uma criança. Se é um facto que sempre se encarou como normal uma criança gostar de brincar, há cem ou duzentos anos não se via tal como sendo um treino que a natureza oferece às capacidades de um futuro adulto tal como a qualquer filhote de animal. Quando a criança brinca, imita ao seu modo o que vê fazer aos adultos que conhece e vai treinando as suas capacidades de crescer.
 E assim, como o modo de vida dos povos tem evoluído é normal que a forma de brincar das crianças também evolua. O interessante é a sua rapidez e como tudo se desactualiza apesar de permanecer ainda uns tempos 'desfazado' (brincava-se ainda com cavalos de pau e jogava-se à espada quando já ninguém andava a cavalo nem havia duelos...)
Vem isto a propósito por dois motivos.
Há poucos dias conversei com uma menina dos seus 8 ou 9 anos. Queixava-se imenso dos fins-de-semana, porque não tinha com quem brincar e apesar de ter sacos cheios de brinquedos, estava farta deles, não tinham graça nenhuma. E os pais (separadosraramente a levavam onde ela queria por serem sítios muito caros. «Olha ontem, por exemplo, disserem que ia ser muito bom e afinal só me compraram este colarzinho» (???)
Nestas coisas é inevitável revivermos a nossa experiência. Como filha única e sem primos, eu sempre brinquei sozinha. Claro que quando aparecia uma amiga era uma festa, mas no dia-a-dia achava natural entreter-me sozinha. Brincadeiras-de-menina: tratava da boneca, e aprendia a costurar vestidos para ela, fazia jantarinhos numa panela pequenina, e ia copiando a lida doméstica das mulheres lá de casa. Ou alinhava cadeiras e bonecos e fazia de professora na escola. Mexia-me muito, saltava à corda, andava a pé-cochinho e fazia equilíbrios vários, sem precisar de brinquedos. Também tinha uma caixinha de costura (uma prenda de Natal) e sabia os rudimentos de costura que praticava. E, com a idade dela já lia imenso, ocupação que não precisa companhia.
Claro que não pretendo que se volte ao passado. Mas chocou-me o contraste entre a infelicidade da  S**** e a satisfação com que eu brincava "a poder de imaginação". E considero que as minhas brincadeiras me treinaram a ser autónoma em casa, e percebi que a S**** não estava a ser preparada para isso, muito pelo contrário. E acho que há um erro por aí porque afinal brincar não está a cumprir a sua função biológica.
Nesta linha de pensamento parece-me que muitos brinquedos actuais não deixam lá muito à imaginação! Porque até é verdade que se brinca muito sozinho, lá isso é - playstations e quejandas - há crianças que passam tardes agarradas a máquinas, mas está lá tudo programado. Máquinas. Se calhar vai ser esse o seu futuro. A mim parece-me triste.
E, o outro motivo que me levou a escrever foi ter lido há pouco sobre uma boneca impressionante para mim. Eu sei que hoje não se fazem vestidinhos de bonecas, compram-se. E os apetrechos para brincar com elas também não se imaginam nem improvisam, também se compram em miniaturas impecáveis. Mas não imaginei (afinal falhanço da minha imaginação) que se vendessem bonecas-iguais-às-donas. Afinal até isso já está feito - para quê imaginar...
Estranho, ou não? 


Pé-de-Cereja

6 comentários:

johnny disse...

:) Estou completamente de acordo contigo. Ainda sou novo mas no meu tempo ainda havia outro tipo de brincadeiras. No meu tempo havia jogos em que era claro que era preciso outro parceiro mas havia por exemplo: Jogar à apanhada, jogar às escondidas, jogar à Cabra Cega... Pode ser que o futuro não seja bem o das máquinas mas é pena e é perigoso porque pode ser! :(

cereja disse...

É isso Johnny.
Havia e ainda há jogos e modos de brincar onde não é preciso "material". Ti citas brincadeiras onde é necessário ainda outro parceiro, mas eu até falei em saltar à corda (eheheh era preciso uma corda claro, mas como material é fraquito!) onde se pode brincar sozinho!
O facto de só se pensar no futuro com máquinas é um pouco assustador. Elas são precisas é evidente, e ajudam a viver melhor, mas... o que importa são os homens!

Joaninha disse...

Como sempre os teus posts de "educação" têm o meu acordo.
Já se disse 1.001 vezes mas nunca é demais: é a geração do TER.
Mas os pais destes meninos já nasceram na geração do TER.

Anónimo disse...

Dás exemplos de "menina" mas também há muitos "de rapaz":
As caricas que davam para fazer corridas? Eram "brinquedos" feitos por nós! Os berlindes... Eram muito baratos e com um abafador circulavam sempre os mesmos.
E jogar á bola? Não era preciso uma bola sofisticada, até a velha bola de trapos era excelente! Porque como dizes, a imaginação ajudava muito.

cereja disse...

Tens razão King, falei da minha experiência, portanto os meus brinquedos e brincadeiras eram "de menina" :)) Deixei-me levar.
Mas corrijo: Lembro-me bem de ver os rapazes aos piparotes às "tampinhas" e pontapés a bolas de trapo. E mais pequeninos até a cavalo num pau de vassoura, a imaginar que era o cavalo de um cowboy! E paus a fazer de espadas ou de espingardas... era esse faz de conta que me parece ter desaparecido, e não gosto.

cereja disse...

Não sei se me expliquei: não gosto porque quando não têm ficam francamente infelizes!!! A menina que citei ali em cima, era uma criança infeliz! O pai tinha-a levado à tal disneylândia da Amadora e depois disso sentia-se muito desgraçada por não ir lá todas as semanas...