terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

O tal «superior interesse da criança»

É uma expressão pomposa utilizada na lei: o superior interesse da criança. Eu tive bastante contacto com esta expressão quando, há já bastantes anos, trabalhei numa área relacionada com a Convenção sobre os Direitos da Criança. E sim, fazia sentido pôr-se em primeiro lugar o «interesse da criança». Mas impressiona-me que, hoje em dia, em tribunais se ultrapasse constantemente esse princípio tão básico! Pode haver muitos interesses, mas o «da criança» é que não é decerto levado em conta.
Ultimamente a comunicação social parece ter despertado para diversas decisões de tribunal no mínimo discutíveis. Claro que, dado o tom sensacionalista que parece nortear as notícias dos nossos media, fica-se um pouco com a pedra no sapato quando vemos reportagens atacando CPCJs ou o trabalho de algumas assistentes sociais, facilitando que se tome a parte pelo todo. Um programa de RTP, Sexta às 9, por mais de uma vez mostrou umas reportagens a propósito de notícias de choque onde arrasava o trabalho de algumas assistentes sociais. Não foi bonito. Foi parcial.
Mas...
A verdade é que (correndo o risco de também estar a ser parcial) sei de muitos, demasiados (!) casos onde o que menos tem contado para o juiz é o tal superior interesse da criança. Tem-se falado recentemente de mais do que uma situação, onde um bebé é retirado à mãe e à família, ainda na maternidade sem se entender qual o risco, gravíssimo decerto, que corria esse bebé! Por exemplo, ainda hoje li no jornal que um juiz retira bebé à mãe com dificuldade em acordar para o amamentar. A sério. Por aquilo que se consegue ler, havia família, havia um pai. Também pelos vistos, mesmo que a mãe tivesse com uma depressão post-parto, (acontece, sabem?) só se refere que ela tinha dificuldade em acordar à noite, não que dormia o dia todo... E um pai também poderia dar um biberon, não é? Menos grave do que retirar o leite materno a este bebé, sabemos bem que os anti-corpos do leite da mãe o vão proteger durante muito tempo. Vai para uma instituição??? Com 6 dias? Qual o superior interesse do bebé?! No outro caso já referido, o bebé foi devolvido à mãe meses depois. Mas a relação perdida, a vinculação tão importante nos primeiros meses de vida, o «colo», a voz, o cheiro, tudo o que liga um bebé à mãe....?
Não entendo.

Também li uma crítica à mãe, acusando-a de ter assinado os documentos e depois se arrepender. E não será normal? Se uma miúda de 23 anos, não tem grande amparo e se sente deprimida deve assinar qualquer coisa... 
Há decerto uns «superiores interesses» mas não são os da criança. 

(vou voltar a este tema da 'leviandade' de alguns juízes, porque é coisa que muito me impressiona)


Cereja

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