Sabemos que são duas línguas. Com a mesma raiz, claro, mas o
brasileiro e o português não são apenas sotaques da mesma língua como se quer
fazer acreditar, a questão é bem maior do que isso. Quem inventou o acordo ortográfico
pode justificar com a evolução do português escrito, que ao longo dos séculos
tem evoluído muito como sabemos e a discussão pode travar-se a esse nível, mas
não com a justificação de que o fazemos para uniformizar com a escrita do
brasileiro. Porque é mesmo uma outra língua.
Eu já tinha ouvido dizer que, por exemplo, as telenovelas
portuguesas que passam no Brasil, levam legendas. E acredito.
Recentemente tive uma noite muito divertida.
O 'pacote' de canais da minha assinatura da cabo foi
alterado enquanto estive de férias. Quando voltei e liguei a tv encontrei
alguns novos e outros fóra do sítio. OK. Não sou esquisita e não tiraram nada
que me fizesse falta. E até me brindaram com uns que até à data ainda não tinha.
O canal da TV5 mudou de sítio e atrelado a ele, talvez por ser falado em francês,
apareceu um novo (?) chamado "eurochannel". Mauzote (para ser
simpática não digo pior) mas interessou-me ver uma série antiga, aí com 20
anos, do inspector Maigret. Fiquei contente, sempre gostei do Simenon, escritor que deu um toque íntimo
ao policial. Satisfeita com a novidade deixei a série a gravar porque eram episódios grandes e eu
tinha outras coisas a fazer.
Quando fui ver a gravação achei que alguma coisa não estava
lá muito bem. Ouvia o texto, que o francês é familiar para mim, mas os olhos
fugiam-me para as legendas (quando há legendas é instintivo espreitar) e algo
não batia certo. Mas que raio....?! Hmmm...
Ao fim de ler o décimo gerúndio consecutivo, pronomes
reflexos antes do verbo, e quase desaparecimento dos artigos definidos, tive
uma iluminação: a tradução era num perfeito brasileiro, aquilo não era para se ler em
português como eu estava a fazer!!! Passou a dar tudo certo.
É que a questão não estava na ortografia e sim na sintaxe.
Claro que também nos termos utilizados, por cá dizemos comboio e não trem,
deitar fora e não jogar fora, mas é toda a construção que é diferente. Dizemos
'olhou lá para dentro' e não 'olhou lá dentro´; 'ele está ao balcão' e não 'ele
está no balcão'; 'há uma hora' e não 'faz uma hora'; etc.
Contudo o engraçado naquele caso era mesmo a ignorância da
língua que traduzia, parecia sê-lo numa daquelas aplicações de tradução
automática (e seria?) Por exemplo «Les existentialistes adorent la couleur du
deuil» apareceu escrito em tradução «os existencialistas gostam da cor do dia»
(??) e uma referência, com um trocadilho, à Juliette Greco - uma mulher
ciumenta acrescentava 'romaine' - resultou em Julieta greco-romana...
Cereja
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