terça-feira, 30 de setembro de 2014

Brasilêz

Sabemos que são duas línguas. Com a mesma raiz, claro, mas o brasileiro e o português não são apenas sotaques da mesma língua como se quer fazer acreditar, a questão é bem maior do que isso. Quem inventou o acordo ortográfico pode justificar com a evolução do português escrito, que ao longo dos séculos tem evoluído muito como sabemos e a discussão pode travar-se a esse nível, mas não com a justificação de que o fazemos para uniformizar com a escrita do brasileiro. Porque é mesmo uma outra língua.
Eu já tinha ouvido dizer que, por exemplo, as telenovelas portuguesas que passam no Brasil, levam legendas. E acredito.
Recentemente tive uma noite muito divertida.
O 'pacote' de canais da minha assinatura da cabo foi alterado enquanto estive de férias. Quando voltei e liguei a tv encontrei alguns novos e outros fóra do sítio. OK. Não sou esquisita e não tiraram nada que me fizesse falta. E até me brindaram com uns que até à data ainda não tinha. O canal da TV5 mudou de sítio e atrelado a ele, talvez por ser falado em francês, apareceu um novo (?) chamado "eurochannel". Mauzote (para ser simpática não digo pior) mas interessou-me ver uma série antiga, aí com 20 anos, do inspector Maigret. Fiquei contente, sempre gostei do Simenon, escritor que deu um toque íntimo ao policial. Satisfeita com a novidade deixei a série a gravar porque eram episódios grandes e eu tinha outras coisas a fazer.
Quando fui ver a gravação achei que alguma coisa não estava lá muito bem. Ouvia o texto, que o francês é familiar para mim, mas os olhos fugiam-me para as legendas (quando há legendas é instintivo espreitar) e algo não batia certo. Mas que raio....?! Hmmm...
Ao fim de ler o décimo gerúndio consecutivo, pronomes reflexos antes do verbo, e quase desaparecimento dos artigos definidos, tive uma iluminação: a tradução era num perfeito brasileiro, aquilo não era para se ler em português como eu estava a fazer!!! Passou a dar tudo certo.
É que a questão não estava na ortografia e sim na sintaxe. Claro que também nos termos utilizados, por cá dizemos comboio e não trem, deitar fora e não jogar fora, mas é toda a construção que é diferente. Dizemos 'olhou lá para dentro' e não 'olhou lá dentro´; 'ele está ao balcão' e não 'ele está no balcão'; 'há uma hora' e não 'faz uma hora'; etc.
Contudo o engraçado naquele caso era mesmo a ignorância da língua que traduzia, parecia sê-lo numa daquelas aplicações de tradução automática (e seria?) Por exemplo «Les existentialistes adorent la couleur du deuil» apareceu escrito em tradução «os existencialistas gostam da cor do dia» (??) e uma referência, com um trocadilho, à Juliette Greco - uma mulher ciumenta acrescentava 'romaine' - resultou em Julieta greco-romana...


Cereja

Sem comentários: