quinta-feira, 19 de março de 2015

Perplexidade

Foi perfeitamente por acaso que deparei com este vídeo. Numa espécie de zapping através das páginas do facebook, abri o vídeo que parecia engraçado.
E é engraçado. Com uma música animada e divertida "prova" que uma máquina (por acaso com um homem lá dentro mas que também poderia ser um robot) pode gerir uma plantação com muita eficiência.
Vejam:



 

Como graça, terá alguma.
Mas pouca. Porque olhando para aquilo como ser humano que sou, mete-me medo. A pouco e pouco a relação humana vai desaparecendo do mundo do trabalho. 

Quando era criança íamos a uma loja fazer compras. Recebia-nos um caixeiro, que ia buscar o que pedíamos, explicava as vantagens de um ou outro produto, embrulhava-o, recebia o nosso dinheiro e dava o troco. Humano, caloroso. Hoje vou a uma loja, meto uma moeda num carrinho de metal, procuro o que preciso nas prateleiras, dirijo-me a um local onde passo num leitor o código de barras daquilo que escolhi, o preço final aparece num ecrã, meto numa ranhura um cartão de plástico e escrevo um código, e saio com as compras. Posso não ter visto um único ser humano! Não era preciso.
Para não falar no que era "ir ao Banco" há 40 anos, onde a relação era bem pessoal e até conhecíamos as pessoas pelo nome, e a substituição desses serviços pelas caixas 'multibanco', utilíssimas sem dúvida, que proliferam por todos os lados e já nem podemos passar sem elas, mas... são máquinas!
E os autocarros! Havia o condutor, e o senhor que nos vendia os bilhetes, um a um, de várias cores. Fazia-lhes um furinho com um alicate, que por vezes servia para ameaçar o menino mais traquina de que lhe fazia o furo na orelha...  Uma relação calorosa.
Bem, voltemos aqui ao vídeo.
A época das vindimas, é época de festa nos campos. Apanham-se os cachos das uvas, um a um, cuidadosamente. Enchem-se os cestos de verga, que depois são despejados em locais para serem lavados e pisados e fermentados, até ao vinho. Um ritual. Vejam agora aquela «vindima» robotizada. Foi rápido, não foi? Dali vai sair qualquer coisa, um sumo, um vinho. Mas não sentem um arrepio?
E a seguir, a colheita dos morangos. Ali até era ainda preciso uma mão humana para escolher os maduros que iriam ser depois vendidos. Mas os que ainda estavam a amadurecer e foram impiedosamente apanhados a eito, o que lhes fazem? Numa apanha manual, o trabalhador sabe colher o que está maduro e deixar amadurecer o que ainda não terminou o processo. É inteligente. A máquina é cega. 
E as couves? Que lindas, todas redondinhas no final, prontas para serem embaladas e vendidas em grandes superfícies. E o que vão fazer às folhas grandes que as envolviam e protegiam? Haverá uma outra máquina que vai aspirar tudo o que ficou e fazer uma grande sopa? Ou deitam fóra?
Pronto, confesso que não gostei nada daquilo. Parecia um sonho mau do que seria (será?) o futuro. Milhões de pessoas desocupadas não porque estejam muito felizes e realizadas numa ocupação de que gostem, mas porque há máquinas que fazem o mesmo (??!) mais depressa e mais barato.
Aquilo era para ter graça.
E, como exagero, até tinha. Mas ficou-me um amargo de boca.

Cereja

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